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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

REQUISITOS PARA A CONFIGURAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS ESTAMPADOS NO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE CONVIVÊNCIA PÚBLICA E CONTÍNUA. RELACIONAMENTOS PARALELOS. ALIMENTOS E EXERCÍCIO DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. DESCABIMENTO. Para o reconhecimento de união estável é necessária a demonstração robusta de seus elementos caracterizadores essenciais, quais sejam, a publicidade, a continuidade, a
estabilidade e o objetivo de constituição de família (art. 1.723 do Código Civil), do que não se desincumbiu a autora. Logo, inexistente a união estável, não há suporte jurídico para embasar a fixação de alimentos em prol da insurgente, nem tampouco o exercício do direito real de habitação sobre o imóvel do pretenso companheiro. APELAÇÃO DESPROVIDA. Acórdão: Apelação Cível n. 70044491231, de Passo Fundo.
Relator: Des. Ricardo Moreira Lins Pastl.
Data da decisão: 27.10.2011.


ACÓRDÃO 
Vistos, relatados e discutidos os autos. 
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo, nos termos dos votos a seguir transcritos. 
Custas na forma da lei. 
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. ALZIR FELIPPE SCHMITZ. 
Porto Alegre, 27 de outubro de 2011. 

DES. RICARDO MOREIRA LINS PASTL, 
Relator. 



Trata-se de recurso de apelação interposto por PATRICIA M. dos S., inconformada com a sentença de improcedência proferida nos autos da ação de declaração de união estável cumulada com pedido de pensão alimentícia e direito real de habitação movida em face do ESPÓLIO DE LIZANDRO R. S. B., posteriormente substituído pelos herdeiros LETÍCIA B., BRUNA B. B., BRUNO G. B., e LIZANDRO A. B. 

Aponta que existem casamentos em que a fidelidade não é o fator determinando da manutenção do vínculo, havendo cônjuges que aceitam ou acabam por aceitar que o outro mantenha relações com terceiros, não se podendo dizer que, em face disso, não sejam casados, apontando que, em sendo a união estável equiparada ao casamento, eventual inexistência de exclusividade das relações não constitui óbice ao reconhecimento da união estável. 

Sustenta que os requisitos da ostensividade e da publicidade restam preenchidos, destacando que a testemunha Alberto noticiou ter dado carona para o falecido, levando-o até sua casa, local em que se encontrava, sendo tratada com muito carinho e na condição de sua esposa, e que, da mesma forma, a testemunha Alessandra confirmou que residia no imóvel com o falecido e que, desde o início da relação, não se afastou do local. 

Menciona que o fato de Lizandro ter mantido relação com Jalusa, no decorrer do ano de 2008, não significa que não tenha retomado com ele sua relação, o que foi confirmado na declaração de fl. 163, em que a testemunha Luiz mencionou o comparecimento do falecido em seu gabinete no mês de novembro de 2008, ocasião em que a apresentou na qualidade de esposa. 

Defende que a declaração de fl. 14, firmada pelo falecido na presença de testemunhas, que também assinaram o documento, é suficiente ao reconhecimento da união estável, assinalando que não há como negar-lhe validade e eficácia, sendo que seu conteúdo só poderia ser afastado na hipótese de restar comprovado o vício de consentimento, o que não ocorreu. 

Aponta que já residia no imóvel pertencente ao falecido quando do ajuizamento da ação e que só não procedeu à juntada de documentos com a inicial em virtude de estar extremamente abalada com a situação vivenciada, o que lhe ocasionou inclusive a percepção de benefício previdenciário, mencionando, ainda, a alteração do patrono no decorrer do processo. 

Prequestionando a matéria, requer o provimento do apelo, com a declaração da existência de união estável e, por consequência, o reconhecimento do direito real de habitação sobre o imóvel onde o casal residia, localizado na Rua Telmo Pedroso Machado, nº 164, Loteamento Pampa, além do direito à percepção de alimentos, por meio de pensão por morte, com sua habilitação junto ao IPERGS (fls. 437/444). 

Apresentadas as contrarrazões (fls. 446/454, 456/463), os autos foram remetidos a esta Corte para julgamento, opinando a Procuradoria de Justiça pelo desprovimento da insurgência (fls. 469/471). 

Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado. 

É o relatório. 

VOTOS 
DES. RICARDO MOREIRA LINS PASTL (RELATOR) 

Eminentes colegas, conheço do apelo, que é próprio, tempestivo (interposto no 30° dia do prazo legal, fls. 436, verso e 437) e dispensado de preparo (benefício da gratuidade judiciária deferido à fl. 25). 

Sustenta a recorrente que viveu em união estável com Lizandro, no período de dezembro de 2002 até a data do seu falecimento, em 13.12.2008 (certidão de óbito, fl. 12), advindo dessa união a filha Letícia, nascida em 13.04.2004 (fl. 10). Postula seja declarada a existência dessa relação e, por conseguinte, seja reconhecido o seu direito real de habitação sobre o imóvel onde residia o casal, localizado na Rua Telmo Pedroso Machado, nº 164, Loteamento Pampa, no Município de Passo Fundo, bem como o direito à percepção de alimentos, por meio de pensão por morte, com sua habilitação junto ao IPERGS. 

Como se sabe, o reconhecimento da união estável, nos moldes do art. 1.723 do Código Civil, depende da demonstração de seus elementos caracterizadores essenciais, quais sejam, a publicidade, a continuidade, a estabilidade e o objetivo de constituição de família. 

No caso presente, na esteira da sentença hostilizada, a recorrente não se desincumbiu do encargo de comprovar que o relacionamento vivenciado com Lizandro foi pautado nestes pressupostos (art. 333, I, do CPC), respeitosamente. 

Nesse particular, por traduzir a compreensão que extraí dos autos, peço vênia para incorporar ao voto, adotando como razões de decidir, o parecer ministerial lançada pela ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Marisa Lara Adami da Silva, que bem sopesou o conjunto probatório constante dos autos, concluindo pela insuficiência de elementos de convicção a conduzir à conclusão de existência de um relacionamento estável havido entre as partes: 
Trata-se de pedido de reconhecimento de união estável entre a apelante e Lizandro Rogério Silveira Bolner, existente de 2002 a 2008, quando este faleceu. 

Sustenta a recorrente que, embora a existência de outros relacionamentos amorosos do de cujus, com ele mantivera uma convivência more uxório, da qual nascera uma filha, Letícia Bolner, tendo residência comum e ostentando vida pública e notória como casal. 

Entretanto, a prova coligida aos autos não autoriza tal conclusão. 

A união estável se caracteriza como a união informal entre duas pessoas com o objetivo de constituição de família, situação esta que, na Constituição Federal de 1988, assim ficou contemplada: 

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 

No mesmo sentido, estão as disposições dos artigos 1723 a 1727 do Código Civil: 

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. 
§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. 
§ 2o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável. 

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos. 

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. 

Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil. 

Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. 

No caso dos autos, verifica-se que Lizandro Rogério Silveira Bolner casara-se em 13 de novembro de 1996 com Rodriane da Silva Bolner. O casal se separou no ano de 2006, segundo as testemunhas ouvidas. Porém, em 2002, ela ajuizara uma ação de separação de corpos em desfavor do de cujus, mas logo se reconciliaram. Em 03 de maio de 2004, nasceu Bruno, filho de Rodriane e de Lizandro (fl. 77). 

Antes disso, Lizandro tivera um relacionamento amoroso com Isabel Bragagnollo, do qual nasceu a filha Bruna e, na constância do casamento dele com Rodriane, estendendo-se até 2008, relacionara-se com Ana Roseli da Silva Alebrandt, tendo o filho Lizandro nascido em 1 de setembro de 2005 (fl. 80). 

Com o término do casamento, Lizandro ocupava o imóvel adquirido por ele e por Rodriane, mantendo, ainda, outros envolvimentos amorosos, alguns de forma concomitante, ou seja, com a autora desta ação, Patrícia, e com Jalusa. Esta última ajuizara, também, uma ação declaratória de união estável em desfavor de Lizandro (processo apenso), buscando o reconhecimento da existência desde maio de 2007 e da dissolução, em setembro de 2008, da união estável havida, sustentando ser a residência comum do casal no imóvel do requerido, tendo havido, no período, construção de benfeitorias. 

A vida amorosa de Lizandro Rogério foi conturbada, com relações afetivas não só sucessivas, mas também simultâneas, tanto é que, em julho de 2006, teve uma internação hospitalar constando como responsável pelo doente Ana, sua esposa, (fl. 135) e, em 21 de agosto de 2006, recebeu um tratamento ambulatorial, tendo como responsável pelo paciente Patrícia, sua esposa (fl. 08). 

Tal dicotomia transparece nos vários depoimentos. Restando, pois, cotejá-los com os documentos acostados e obter os pontos comuns, quais sejam: vários relacionamentos; quatro filhos de diferentes mulheres, entre eles dois nascidos no ano de 2004 (Bruno e Letícia), bem como outro no ano seguinte (Lizandro); casamento mantido com Rodriane até 2006; convivência com Jalusa de 2007 a 2008, chamada pelo vizinho Roberto de Camila (fl. 217); referência de que Patrícia era apenas faxineira na casa de Lizandro, passando a ocupá-la após a sua morte; recibos de fls. 203, 204 e 231 referentes ao pagamento de quantias a título de alimentos aos filhos, Bruno, Bruna e Letícia, respectivamente, demonstrando que com eles não morava o genitor. 

Diante de tais evidências, faz-se difícil detectar os requisitos necessários ao reconhecimento do relacionamento da apelante com Lizandro como união estável, ou seja, uma relação afetiva de convivência pública e duradoura entre duas pessoas (...) com o objetivo imediato de constituição de família . 

É bem verdade que foi juntada aos autos uma declaração do próprio Lizandro, firmada três dias antes de sua trágica morte, a qual se contrapõe ao documento de fl. 231, que configura o pagamento do encargo alimentar à filha, e ao conjunto probatório alicerçado no feito. 

Os relacionamentos casuais, entrecortados e poligâmicos não estão albergados no conceito de união estável trazido pela normativa constitucional e civil, já que neles não se pode reconhecer a presença da estabilidade, da continuidade, da publicidade e do objetivo de constituição de família . Logo, não restou caracterizada a relação amorosa da autora com Lizandro como união estável, pois ausentes os requisitos indispensáveis ao seu reconhecimento da sociedade conjugal de fato. 

Como se vê, em que pese o conjunto probatório carreado aos autos não tenha deixado dúvidas quanto à existência de um relacionamento afetivo havido entre a autora e Lizandro, do qual adveio o nascimento da filha Letícia, em 13.04.2004 (fl. 10) - especialmente, boletim de atendimento hospitalar, termo de audiência e termo de entrega do fardamento de Lizandro, em que foi qualificada como sua esposa, fls. 8, 11 e 13; fotos, fls. 17/24 -, deixou evidente, em contrapartida, a continuidade, até o ano de 2006, da relação conjugal do de cujus com a sua esposa Rodriane (casados desde 1996, com a qual teve o filho Bruno, nascido em 03.05.2004, fl. 77), além da manutenção de outros relacionamentos extraconjugais, com Isabel (com a qual teve a filha Bruna), com Ana Roseli (com a qual teve o filho Lizandro, nascido em 01.09.2005, fl. 80), e, em 2007, após o fim do casamento com Rodriane, com Jalusa, por cerca de um ano (quando esta ajuizou ação declaratória de união estável, autuada sob o nº 021/1.08.0014185-1, em apenso, a qual foi extinta em face do falecimento das partes). 

A despeito da declaração firmada por Lizandro, em 10.12.2008, de que mantinha uma união estável com Patrícia desde 28.12.2002 (fl. 14), e das declarações de Sônia, de Alessandra e de Graciela Zardo, de que a autora, desde o início do relacionamento, passou a residir com o companheiro Lizandro, na Rua Telmo Pedroso Machado, nº 164 (fls. 164, 165 e 241, sendo que a primeira e última, sintomaticamente, não foram arroladas como testemunhas pela autora, como se vê à fl. 184), o fato é que as testemunhas ouvidas na instrução, com exceção de Alberto de Oliveira (que afirmou não ter visto, além de Patrícia, nenhuma outra mulher na casa de Lizandro, fls. 211/213) e de Alessandra (que já havia firmado em 27.01.2008 a referida declaração de fl. 165), apontaram no sentido de que Rodriane era quem, até o ano 2006, residia com o de cujus no aludido endereço e que, após o rompimento do casamento, foi Jalusa, em 2007, que com ele passou a residir, tendo Patrícia, por sua vez, passado a ocupar a casa somente após o seu falecimento. 

A esse respeito, impera transcrever trechos dos depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas em juízo: 

Testemunha Rosemeri – vizinha do de cujus 
(...) 
Juiz: Fica sob compromisso. Há quanto tempo a senhora conhece a Dona Patrícia? 
Testemunha: Nesses últimos meses após o falecimento do senhor Bolner que ela foi residir na casa. 
Juiz: A senhora diz que mora ao lado, é exatamente ao lado? 
Testemunha: Não é exatamente ao lado, é a segunda casa após. 
Juiz: E segundo a senhora após o falecimento do seu Lizandro que ela passou a ocupar a casa? 
Testemunha: Sim. 
Juiz: Quem morava antes disso lá? 
Testemunha: Eu resido na minha casa antes do Bolner construir a casa dele, aí quando ele construiu ele foi residir com a (Rodriane), e agora está a Dona Patrícia. 
Juiz: E nesse intervalo alguém residiu com ele lá? 
Testemunha: Não vi residindo, eu trabalho o dia todo, começo as sete e meia da manhã e retorno as cinco e trinta da tarde e durante a noite eu faço faculdade, então eu vi algumas vezes uma outra moça lá, mas que eu saiba ela não residiu na casa. 
Juiz: É essa moça aqui? 
Testemunha: Sim. 
Juiz: Fica consignado que a depoente se refere a fotografia da folha 34 do processo antes referido. 
Testemunha: Mas eu não sei dizer se ela residiu, porque eu vi umas duas ou três vezes somente, até por eu não parar muito tempo em casa. 
Juiz: E nesse intervalo entre a Dona (Rodriane), essa moça que a senhora refere aqui e a Dona Patrícia o seu Bolner morou sozinho na casa? 
Testemunha: Sozinho, ele ficou até bastante sozinho, todo o período que a (Rodriane) saiu ele ficava sozinho, a casa ficava praticamente fechada. 
(...) 
Juiz: A sabe se ele conviveu com alguém nesse meio tempo depois da separação da Dona (Rodriane)? 
Testemunha: Que eu saiba não, não sei informar. 
Juiz: Mesmo não na casa dele, em algum outro lugar, sabe? 
Testemunha: Não sei. 
Juiz: Pelo Procurador das Requeridas. 
Procurador das Requeridas: Do período do falecimento pra trás, ela pode precisar quanto tempo ou até que período a Dona (Rodriane) residiu com ele? 
Testemunha: Pelo que eu lembro, porque nós moramos lá há oito anos, eu construí a casa em 2002 e eu acho que uns dois anos depois que eles construíram e foram morar lá, então eu acredito que a (Rodriane) e o Bolner moraram lá até 2006 eu acho. Depois disso a (Rodriane) e o Bolner ficou um longo tempo sozinho na casa. [grifei, fls. 216/217] 

Testemunha Roberto – vizinho do de cujus 
(...) 
Juiz: E a Dona Patrícia o senhor conheceu há quanto tempo? 
Testemunha: Conhecer assim só de vista. 
Juiz: Quando mais ou menos? 
Testemunha: Eu via ela na casa só de vista, mas eu comecei a ver ela mais frequente depois da morte do Bolner. 
Juiz: E ela morava na casa antes dele morrer? 
Testemunha: Não. 
Juiz: Quem morava lá? 
Testemunha: Primeiro era a (Rodriane). 
Juiz: Até quando? 
Testemunha: Até quando se separou. 
Juiz: O senhor tem ideia de quando eles se separam? Porque eles têm um processo de separação de 2002 e há uma afirmação de que eles continuaram a viver juntos. 
Testemunha: Ela estava... de setembro até a morte dele ela ia lá com o filho. 
Juiz: Ir lá é uma coisa, eu estou perguntando até quando eles moraram lá? 
Testemunha: Eu não tenho como afirmar, mas eu acho que deve ter sido até 2006. 
Juiz: Ali eles teriam se separado? 
Testemunha: É. 
Juiz: Não voltaram a conviver? 
Testemunha: Frequentemente ela ia lá com o filho, levar o filho pra ele. 
Juiz: Isso é uma coisa, eu estou perguntando se eles viviam juntos, tinham relacionamento como marido e mulher? 
Testemunha: De morar junto não. 
Juiz: 2006 aproximadamente? 
Testemunha: Até 2006 moravam juntos. 
Juiz: Depois disso o seu Bolner morou com quem nessa casa? 
Testemunha: Ele morou com uma guria, que apresentou pra mim por Camila. 
Juiz: O senhor lembra quando foi isso? 
Testemunha: Foi uns 6 meses depois da separação, ou mais. 
Juiz: E quanto tempo a Camila ficou morando com ele? 
Testemunha: Ela ficou morando um ano e pouco, até setembro mais ou menos. 
Juiz: Até setembro de 2008? 
Testemunha: De 2008. 
Juiz: Pouco antes dele morrer? 
Testemunha: É. 
Juiz: E a Dona Patrícia passou a morar lá quando? 
Testemunha: Eu não conhecia, não sabia nem que o nome dela era Patrícia... 
Juiz: Mas o senhor via ela por lá? 
Testemunha: Eu via ela por lá, porque o Bolner me falou: “se tu ver uma mulher ali vai estar a faxineira limpando a casa e tu não precisa se preocupar”, porque tanto ele cuidava a minha casa como eu cuidava a casa pra ele. 
Juiz: E o senhor identifica a tal faxineira com a Dona Patrícia? 
Testemunha: Exato. 
Juiz: E quando ela passou a morar na casa? 
Testemunha: No dia que tinha o velório eu vi ela lá no velório e de noite eu vi ela indo lá acender as luzes. 
Juiz: Antes disso ela nunca tinha vivido ali? 
Testemunha: Não. 
Juiz: O senhor sabe alguma outra coisa sobre a vida sentimental e amorosa do seu Bolner? 
Testemunha: Eu fiquei sabendo até no velório quando eu cheguei lá e perguntei: “onde está o velório da Camila?”, e aí fiquei sabendo que aquele nome não era daquela moça que morreu, ela tinha outro nome, pra nós... 
Juiz: Camila é a moça que morreu com ele? 
Testemunha: Ele apresentou pra nós por Camila. 
Juiz: E ele dizia o que dessa moça, que seria o que dele? 
Testemunha: Que era namorada e que estava vivendo com ele. 
Juiz: E ela ficou efetivamente vivendo por um ano e pouco? 
Testemunha: Um ano e cinco meses, seis meses. 
Juiz: Pelo Procurador dos Requeridos. 
Procurador dos Requeridos: O senhor pode mostrar a foto... 
Juiz: Essa moça é a Camila? 
Testemunha: Exato, essa aí. 
Juiz: Fica consignado que se trata da mesma fotografia já referia anteriormente. 
(...) [grifei, fls. 217, verso/220] 

Testemunha Etelvina - colega de trabalho de Rodriane 
(...) 
Juiz: A senhora sabe até quando eles estiveram casados? 
Testemunha: Até 2006 que a (Rodriane) trabalhou comigo eles estavam casados e morando juntos. 
Juiz: A senhora sabe que eles se separam judicialmente? 
Testemunha: Não, eu não acompanhei. Eu vendi a empresa, ela parou de trabalhar comigo, não tive mais relacionamento com ela e nem com ele. 
Juiz: E a senhora sabe como eles continuavam casados? 
Testemunha: Não sei. 
Juiz: Até 2006? 
Testemunha: Até 2006 eles estavam casados... 
(...) [fls. 220, verso/221, verso] 

Testemunha Lisênia – irmã de Lizandro 
(...) 
Juiz: A senhora sabe me dizer até quando perdurou o casamento do seu Lizandro e da Dona (Rodriane)? 
Testemunha: Eles moraram juntos até 2006, na casa que ela ajudou a construir, ela trabalhou junto com ele pra construírem aquele bem. 
Juiz: E posteriormente a isso eles voltaram a ter algum relacionamento? 
Testemunha: Eu sei assim que de vez em quando ela ia lá na casa, que eles tinham alguma amizade ou coisa assim, mas eu não posso lhe afirmar. 
Juiz: Ele teve outras companheiras depois da Dona (Rodriane)? 
Testemunha: Ele teve a moça essa que faleceu junto com ele, a Jalusa, que também pra nós era um namorico, pode se dizer assim. 
Juiz: Mas ela morava com ele? 
Testemunha: Que eu saiba não, que eu saiba ela foi algumas vezes posar na casa dele ou alguma coisa assim. Até tem um fato, eu trabalhava numa loja e ela esteve nessa loja, aí eu fui fazer um cadastro pra ela pra ela receber mala direta e ela me disse que não tinha endereço fixo aqui em Passo Fundo ainda, que ela estava querendo ir morar na casa dele, daí eu disse: “mas como vai morar, nem conhece ele direito”, foi isso. Que eu saiba eles não moravam juntos, eram apenas namorados. 
Juiz: Ele alguma vez referiu algo a respeito dela, da relação que ele mantinha com ela? 
Testemunha: Não. 
Juiz: Então a senhora não sabe se eles tinham algo mais serio? 
Testemunha: Eu sabia que eram namorados. 
Juiz: E a Dona Patrícia? 
Testemunha: A Patrícia que eu saiba teve essa relação com ele e teve uma menina, aí uma vez ele comentou lá na casa da minha mãe que ela tinha a chave da casa dele porque ela fazia faxina pra ele, lavava as roupas dele. 
Juiz: E quando teria começado esse trabalho dela na casa dele? 
Testemunha: Eu não sei lhe dizer a data. 
Juiz: Aproximadamente, ele já estava separado da Dona (Rodriane)? 
Testemunha: Eu acredito que sim. 
Juiz: Então de 2006 em diante a senhora acredita que ela tenha trabalhado pra ele? 
Testemunha: Acredito que sim. 
Juiz: A senhora sabe que o seu irmão fez uma declaração dando conta de que viveu com ela de dezembro de 2002 até 10 de dezembro do ano passado? 
Testemunha: Eu tive conhecimento dessa declaração, até inclusive... 
Juiz: É dele mesmo? 
Testemunha: Não sei lhe dizer se a assinatura é dele porque eu não vi. Eu soube que houve essa declaração, só que eu soube também que essa declaração foi feita dia 10 de dezembro, e ele veio a falecer dia 13 de dezembro, ou seja, ele não veio a falecer por... ele se matou, eu acredito que pra dia 10 de dezembro ele ter assinado alguma coisa ele certamente não estava muito certo ainda do que ele estava fazendo. 
Juiz: Mas isso é uma hipótese sua. 
Testemunha: É uma suposição minha. [grifei, fls. 222/223] 

Diante desse contexto, como atenta e corretamente ponderou o nobre magistrado singular, Dr. Luis Christiano Enger Aires, “apesar da declaração [de fl. 14], a vida privada do falecido a desmente, considerando a promiscuidade que sempre a caracterizou e seu descompromisso com os relacionamentos que cultivou ao longo do tempo. Ou seja, apesar dos filhos que teve com várias mulheres e dos laços que com elas estabeleceu a partir do sexo e da paternidade, jamais se comprometeu profundamente com elas. Nem com a esposa, como pode se ver do afirmado na contestação (fls. 69/71), nem – certamente – com qualquer outra delas, inclusive a autora” (fl. 432). 

Não é demais salientar, a esse respeito, que nesse tipo de adesão amorosa, a ausência de compromisso com a fidelidade para com o outro, bem como a falta de publicidade da convivência descaracterizam a affectio maritalis, afastando a tradução defendida na insurgência, de compartilhamento de vida comum estável. 

Nesse sentido, colaciono: 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. ONUS DA PROVA. Na ação de reconhecimento de união estável se lida com a delicada questão de "estado das pessoas", não havendo espaço para dúvidas, porquanto se declara um direito. Imprescindível a prova robusta de que a relação vivenciada pelas partes, configuradora da união equiparada ao casamento, continha a convivência pública, contínua e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Ausente prova nesse sentido, não há como acolher a pretensão da parte. APELO NÃO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70034340059, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, 28/04/2011) 

UNIÃO ESTÁVEL. PEDIDO DE RECONHECIMENTO. RELACIONAMENTO AMOROSO PROLONGADO. COABITAÇÃO. INTENÇÃO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. PROVA. EFEITO DO RECURSO. NULIDADE PROCESSUAL. INOCORRÊNCIA. 1. Se a sentença hostilizada apresentou omissão sobre fato processual relevante, o remédio cabível é a oposição de embargos de declaração, recurso este que foi manejado, inexistindo motivo para desconstituir a sentença. 2. Se o recurso de apelação foi recebido em seu duplo efeito e a parte recorrida não concordava com isso, deveria ter manejado o recurso próprio, no momento oportuno, não sendo possível apreciar questão preclusa. Inteligência do art. 522 do CPC. 3. Se os litigantes mantiveram prolongado relacionamento amoroso, mas sem prova de continuidade, tanto que o varão teve outras namoradas no período, sem coabitação e sem o intuito de constituírem um núcleo familiar, a relação entretida não configurou união estável, cujos requisitos são, nos termos do art. 1.723 do Código Civil, (a) a diversidade de sexos, (b) a convivência pública, contínua e duradoura, (c) estabelecida com o objetivo de constituição de uma família. 4. Indemonstrada a união estável ou a sociedade de fato descabe cogitar de partilha de bens, inexistindo também liame obrigacional entre os litigantes capaz de albergar o pleito alimentar. Recurso provido, por maioria. (Apelação Cível Nº 70022262257, Sétima Câmara Cível, TJRS, Relator Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, 12/03/2008) 

Assim, diante desse panorama, tenho que deve ser mantida incólume a sentença vergastada, no sentido da improcedência do pedido de declaração de união estável, inexistindo, por conseguinte, suporte jurídico a embasar o pedido de reconhecimento do direito ao recebimento de alimentos, bem como do exercício do direito real de habitação sobre o imóvel no qual reside a parte autora por força da liminar de fl. 34, a respeito do qual, como restou consignado pelo julgador singular, inexiste prova nos autos de ter a autora, de qualquer forma, contribuído para sua aquisição ou emprego de benfeitorias. 

ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao apelo. 

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (PRESIDENTE E REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). 

DES. ALZIR FELIPPE SCHMITZ - De acordo com o(a) Relator(a). 

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS - Presidente - Apelação Cível nº 70044491231, Comarca de Passo Fundo: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME." 

Julgador(a) de 1º Grau: LUIS CHRISTIANO ENGER AIRES

FONTE: TJRS

Maria da Glória Perez Delgado Sanches

Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.

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ITANHAÉM, MEU PARAÍSO

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MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

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