Órgão
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1ª Turma Cível
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Processo N.
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Apelação Cível
20100111886603APC
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Apelante(s)
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P. G. V. M. E OUTROS
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Apelado(s)
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OS MESMOS
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Relator
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Desembargador TEÓFILO CAETANO
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Revisor
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Desembargador FLAVIO ROSTIROLA
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Acórdão Nº
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593.948
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E M E N
T A
DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO DIRETO. DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE
CONJUGAL. DECRETAÇÃO. PATRIMÔNIO COMUM. PARTILHA. REGIME DE BENS. COMUNHÃO
UNIVERSAL. ALCANCE. BENS TRANSCRITOS EM NOME DOS CÔNJUGES
E ADQUIRIDOS ANTES DA FORMALIZAÇÃO DA RUPTURA DA VIDA COMUM. NOME DA VIRAGO.
ADOÇÃO DO PATRONÍMICO DO MARIDO. PRESERVAÇÃO. IDENTIFICAÇÃO PROFISSIONAL E
SOCIAL. OPÇÃO. PRESERVAÇÃO. INCIDENTE DE INSANIDADE. FORMULAÇÃO. INTERSEÇÃO NA
LIDE PRINCIPAL. INSUBSISTÊNCIA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA.
2. O
novo Código Civil, alterando o paradigma anteriormente firmado, estabelecera
que, não se cogitando de culpa como pressuposto para a afirmação da dissolução
da vida conjugal através do divórcio, a preservação do nome de casado é opção
assegurada ao cônjuge, não consubstanciando efeito anexo lógico da sentença que
decreta a separação ou o divórcio nem reclamando opção justificada na forma
anteriormente regulada (artigos 1.571, § 2º, e 1.578, § 2º, ambos do CC),
resultando que, em tendo a cônjuge virago optado por permanecer usando o
patronímico do marido por ter se incorporado à personalidade, identificando-a
no meio social e profissional em que convive, a opção deve ser materializada.
4. Inviável a resolução no
bojo da ação de estado de pretensão atinada com o reconhecimento de sonegação
ou dilapidação de patrimônio comum, notadamente quando encerra a inserção no
monte de bens transcritos em nome de terceiros, intuito que, à vista da
litigiosidade estabelecida sobre o patrimônio partilhável, deverá ser postulado
em procedimento próprio e com observância do devido processo legal, deve o
monte partilhável, sob essa moldura, ser modulado de conformidade com os
títulos de propriedade exibidos.
A C Ó R D Ã O
Acordam os Senhores Desembargadores da 1ª Turma Cível
do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, TEÓFILO CAETANO
- Relator, FLAVIO ROSTIROLA - Revisor, ANA
CANTARINO - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador LÉCIO
RESENDE, em proferir a seguinte decisão: CONHECER
DOS RECURSOS, REJEITAR A(S) PRELIMINAR(ES) E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO
APELO DO AUTOR E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO DA RÉ, UNÂNIME , de acordo com
a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília
(DF), 6 de junho de 2012
Certificado nº: 1F 6C 8C 1D 00 05 00 00 0E 63
06/06/2012 - 19:09
Desembargador TEÓFILO CAETANO
Relator
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R E L A
T Ó R I O
Cuida-se de ação de divórcio direto
aviada por P. G. V. de M. em
desfavor de J. D. A. B. V. de M. almejando
a decretação do divórcio do casal e a colocação de termo ao vínculo advindo do
casamento celebrado em 22 de setembro de 1987, sob o regime da comunhão
universal de bens, determinando-se que a virago volte a usar seu próprio
patronímico[1].
Enleia como estofo argumentativo para a pretensão que deduzira a inviabilidade
do restabelecimento da vida em comum, que restara dissolvida no mês de dezembro
de 2007, quando o casal viera a se separar de fato, e a impossibilidade de se
estabelecer acordo de molde a que fosse viabilizada a dissolução do vínculo sem
necessidade de intervenção judicial, já que da união não advieram filhos.
Assinalara que, dissolvida a vida em comum e o vínculo matrimonial, a virago
deverá voltar a usar o nome de solteira, pois injustificável que continue a
utilizar-se do seu nome de família.
Em contestação[2],
a ré, ao elencar os bens imóveis, os frutos civis e as dívidas que constituem o
acervo patrimonial do casal, manifestara-se favoravelmente à decretação do
divórcio, requerendo, a seu turno, a determinação da partilha do acervo
amealhado e a realização de exame de higidez mental do autor, e, ainda, a
improcedência do pedido de adoção do seu próprio patronímico, de modo a
abandonar o nome adotado após a convolação das núpcias.
Aludidos argumentos e pretensões foram
novamente enumerados na reconvenção aviada pela ré[3],
em que pugnara pela submissão do autor a exame pericial para fins de aferição
de sua higidez física e mental. Aduzira que adotara o patronímico do autor e
que permanecera utilizando-o em sua carreira profissional, sendo reconhecida
publicamente por período superior a duas décadas em razão de sua atuação junto
à Justiça Federal e à Advocacia-Geral da União. Concluíra que a alteração de
seu sobrenome provocaria prejuízos evidentes em sua identificação profissional.
Arrolara os bens amealhados na
constância da união matrimonial, fazendo constar, segundo alegara, os que foram
alienados ou doados aos filhos do autor/reconvindo desrespeitando a meação e em
prejuízo da partilha, alinhavando, de outra parte, as dívidas que deveriam ser
consideradas comuns do casal, relativas aos pagamentos que custeara
exclusivamente e destinados à mantença dos bens imóveis incrustados em condomínio. Ao
aviar a pretensão reconvencional, reclamara a ré a suspensão do processo até o
julgamento da exceção de suspeição que formulara e defendera a partilha dos
bens constituintes do acervo patrimonial comum ao ser decretado o divórcio.
O inventário alinhado pela ré/reconvinte
acerca do patrimônio e obrigações comuns que deveriam ser partilhados alcançara
os seguintes imóveis, frutos civis e dívidas consideradas comuns:
I) Lotes n. 47 e 49 do Condomínio
Parque e Jardim das Paineiras, Fazenda Taboquinha – Jardim Botânico – Lago
Sul/DF, sobre os quais se edificou uma casa residencial de valor estimado em R$
543.681,61 (quinhentos e quarenta e três mil seiscentos e oitenta e um reais e
sessenta e um centavos), conforme declaração de ajuste anual apresentada em
2010 pelo casal[4];
II) Apartamento n. 2106 do Lote 1250,
localizado na Avenida Castanheira – Águas Claras/DF, com 120 m² de área total e vaga
de garagem, escriturado em nome do filho do autor/reconvindo, Felipe Augusto
Monteiro Vaz de Mello, com usufruto vitalício do casal, avaliado em R$
250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais), consoante declaração de ajuste
anual apresentada em 2010; [5]
III) Apartamento n. 803, do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima n. 1324, Belo Horizonte/MG, ocupado
eventualmente pelo reconvindo e com valor aproximado de R$ 40.000,00 (quarenta
mil reais), na forma da declaração de ajuste anual apresentada em 2010[6];
IV) Apartamento n. 503 do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima n. 1324, Belo Horizonte/MG, atualmente
locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo e valor constante da
declaração de ajuste anual de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais)[7];
V) Apartamento n. 1502 do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima, n. 1324, Belo Horizonte/MG, atualmente
locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo e valor constante de
declaração de ajuste anual de R$ 100.000,00 (cem mil reais)[8];
VI) Sala n. 701 e respectiva vaga de
garagem, situada no edifício Mondrian Trade Center, Belo Horizonte/MG, atualmente
locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo, e valor constante de
declaração de ajuste anual de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais)[9];
VII) Apartamento n. 705 do Edifício
Leila, situado na Avenida José Ferreira Ferro n. 1415, Guarapari/ES, eventualmente
ocupado pelo reconvindo e equivalente a R$ 80.000,00 (oitenta mil reais),
conforme declaração anual de ajuste de 2010[10];
VIII) Apartamento n. 2401 e vagas de
garagem n. 166 e 181, todos situados no Condomínio Mirante das Águas,
localizado na Rua Alecrim, Lote 4, Águas Claras/DF, ocupado eventualmente pelo
reconvindo e correspondente a R$ 410.000,00 (quatrocentos e dez mil reais),
conforme declaração anual de ajuste de 2010 [11];
IX) Apartamento n. 901 do Edifício
Stilo Residencial Clube, situado na Rua Alecrim, Lote 06, bloco A e vaga de
garagem n.131, atualmente locado com frutos civis revertidos apenas em favor da
reconvinte, de valor aproximado de R$ 105.946,47 (cento e cinco mil e
novecentos e quarenta e seis mil e
quarenta e sete centavos), valor declinado na declaração de ajuste anual de
2010[12];
X) Sala n. 807 do Edifício Fashion
Center, situado na Rua Guajajaras n. 1470, Belo Horizonte, com frutos
revertidos apenas em favor do reconvindo, e valor constante de declaração de
ajuste anual no importe de R$18.000,00 (dezoito mil reais)[13];
XI) Apartamento n. 801 do Edifício
Residencial Jardim das Oliveiras, situado na Rua Rio das Mortes n. 170, Belo
Horizonte/MG, a ser escriturado em favor de Felipe Augusto Monteiro Vaz de
Mello, filho do reconvindo, supostamente adquirido por R$ 180.000,00 (cento e
oitenta mil reais), com recursos decorrentes da venda do apartamento n. 1807 do
bloco II do Edifício Fontana de Trevi, situado na Rua Mato Grosso n. 666, Barro
Preto, Belo Horizonte[14];
XII) apartamento nº 301 do Edifício
Residencial Cláudia Lara, situado na Avenida Flávio dos Santos n. 330, Bairro
Floresta, Belo Horizonte/MG, atualmente locado, com frutos revertidos em favor
de F. A. M. V. M., filho do reconvindo, e de valor atribuído pela reconvinte no
montante de R$220.000,00 (duzentos e vinte mil reais)[15];
XIII) dívidas quitadas exclusivamente
pela reconvinte[16],
oriundas de manutenção de patrimônio comum, no valor apurado de R$195.522,02
(cento e noventa e cinco mil quinhentos e vinte e dois reais e dois centavos);
XIV) dívida do casal, avaliada em R$
33.365,11 (trinta e três mil trezentos e sessenta e cinco reais e onze
centavos), decorrentes da inadimplência das taxas de condomínio dos lotes n. 47
e 49[17],
ambos situados no Condomínio Parque e Jardim das Paineiras, Fazenda Taboquinha,
Jardim Botânico – Lago Sul/DF, cujo pagamento foi retardado até o ano de 2006,
quando, supostamente, a reconvinte passou a efetuar, por conta própria, os
pagamentos mensais.[18]
Do decisório que indeferira o
processamento, em conjunto, da pretensão formulada em reconvenção com o
objetivo de ser inventariado e partilhado o acervo patrimonial, por
incompatibilidade de procedimentos[19],
fora interposto agravo de instrumento, cujo efeito suspensivo, deferido em
caráter liminar[20],
restara confirmado pela Turma Revisora, assegurando-se, então, o processamento
da pretensão reconvencional.[21]
A resposta à reconvenção fora
alicerçada, em síntese, na impossibilidade do pedido de partilha em sede de
ação de divórcio por meio da via eleita pela ré/reconvinte e na ausência de
atendimento às regras do ônus probatório, pois não teria ela, segundo o
defendido pelo autor-reconvindo, comprovado nenhuma das alegações alinhadas[22]
Cumprido o itinerário procedimental,
durante o qual o Ministério Público assinalara que não subsistia fato apto a
legitimar sua interseção na relação processual e foram colhidas provas orais,
sobreviera sentença, prolatada na audiência de instrução e julgamento, que
resolvera as pretensões principal e reconvencional sob a seguinte formatação [23]:
“III-
Dispositivo – a) Da Lide Principal –
DIANTE
DO EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos contidos na inicial, com
resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do código de Processo Civil,
para decretar o divórcio das partes, permanecendo a requerida com o nome de
casada, ou seja, J.D.A.B.V. de M.. Tendo em vista a sucumbência recíproca,
condeno as partes ao pagamento pro rata (50%- cinqüenta por cento – para o
autor e 50% - cinqüenta por cento – para ré) das custas e honorários
advocatícios, os quais fixo EM R$ 2.000,00 (dois mil reais), conforme disposto
nos arts. 20, §4º, e 21, caput, ambos do Código de Processo Civil, observada a
compensação quanto aos últimos (sumula 306 do STJ).
(...)
B) Da Reconvenção – DIANTE DO EXPOSTO,
julgo parcialmente procedente o pedido reconvencional para partilhar o
patrimônio comum, a seguir relacionado, cabendo a cada uma das partes 50%
(cinqüenta por cento) de cada bem, direito e dívidas: 1) direitos inerentes aos
Lotes 47 (fls. 520-522) e 49 localizados no Condomínio Parque e Jardim das
Paineiras, Fazenda Taboquinha, Bairro Jardim Botânico, Lago Sul, adquiridos em
18/09/1995, pendente de regularização; 2) apto. 803 do Edifício Alvorada,
Avenida Augusto Lima, 1324, Belo Horizonte MG, adquirido em 03/02/2006 (fls.
586-588); 3) apto. 503 do Edifício Alvorada, Avenida Augusto Lima, 1324, Belo
Horizonte MG, adquirido em 22/09/2006 (fls. 589-590); 4) sala 701, do Edifício
Mondrian Trade Center, Belo Horizonte MG, adquirido em 01/02/2006 (fls. 597-598);
5) apto. 705 do Edifício Leila, Avenida José Ferreira Ferro, 1415,
Guarapari/ES, adquirido em 12/07/2007 (fls. 578); 6) direitos inerentes ao
Apto. 2401 e vagas de garagem 166 e 181 do Condomínio Mirante das Águas, rua
Alecrim, Lote 04, Águas Claras, adquirido em 30/01/2007, (fls. 508 e cessão de
direitos fls. 54-56 e 98-100); 7) direitos inerentes ao Apto. 901 e garagem 131
do Edifício Stilo Residencial Clube, Rua Alecrim, Lote 06, bloco A, adquirido
em 16/06/2007; (fls. 507, promessa de compra e venda, fls. 533-540); 8)
usufruto dos apartamentos descritos nas certidões de fls. 509-510 e 580-582; 9)
dívida de R$33.365,11 (trinta e três mil e trezentos e sessenta e cinco reais e
onze centavos) , em 17/03/2012 (fls. 105 a 113). Tendo em vista a sucumbência
recíproca, condeno as partes ao pagamento pro rata (50% - cinquenta por cento
para a ré-reconvinte e 50% - cinquenta por cento para o autor reconvindo) das
custas e honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 6.000,00 (seis mil
reais), conforme disposto nos arts. 20, §4º, e 21, caput, ambos do Código de
Processo Civil, observada a compensação quanto aos últimos (Súmula 306 do
STJ).”.
Inconformadas, ambas as partes aviaram
recursos de apelação.
O autor/reconvindo[24]
insurge-se quanto à manutenção do seu patronímico pela ré/reconvinte,
argumentando, para tanto, que a adoção do próprio nome de família ostentada por
ela antes do casamento não lhe ocasionaria prejuízos, não se inscrevendo em
quaisquer das hipóteses previstas no art. 1578 do Código Civil. Acrescera que,
além do mais, em seu meio profissional a ré/reconvinte seria conhecida tão
somente por J. D., ou seja, sem a adoção do patronímico. Prosseguira aduzindo
que o apelido de família é elemento essencial da designação legal do sujeito,
tornando-se verdadeiro patrimônio moral e social da pessoa, que o individualiza
dentro da sociedade e o aponta para sua posição social. Complementara seu
raciocínio verberando que a ré/reconvinte não se demonstrara digna de
permanecer utilizando-se do seu patronímico. Requerera, alfim, a reforma do
julgado para que seja determinado que a ré/reconvinte volte a usar o nome de
solteira.
A seu turno, nas razões lançadas em seu
apelo[25],
a ré suscitara preliminar de nulidade da sentença, com estofo na não apreciação
da ação cautelar incidental de insanidade mental que aviara em desfavor do
autor/reconvindo[26]
e que fora distribuída, por dependência, ao Juízo a quo., na data em que se realizara a audiência de instrução e
julgamento Argumentara que o magistrado sentenciante, ao optar por não decidir
a cautelar incidental, quedara-se de se atentar para o fato de que eventual
provimento de interdição do autor tornaria anuláveis os atos jurídicos
praticados na demanda principal.
No mérito, defendera a necessidade de
ser considerado o mês de maio de 2010 como marco da separação de fato dos
litigantes, uma vez que, entre eles, houvera a permanência de relacionamento
íntimo, com o intuito de reconciliação, a despeito de residirem separadamente.
Concluíra, neste ponto, que a manutenção do mês de dezembro de 2007 como o mês
da separação de fato do casal ensejaria a exclusão, da partilha, de alguns bens
imóveis.[27]
Prosseguira sustentando ter havido sonegação de bens no arrolamento, por terem
quedado omitidas as aquisições, no ano de 2010, de duas salas no Edifício
Mondrian Trade Center, situado na Rua Mato Grosso n. 539, Barro Preto – Belo
Horizonte-MG, cuja prova fora produzida pelo autor mediante a juntada da
declaração de ajuste anual do ano-exercício 2010[28].
Aduzira, ainda, ter havido sonegação de
frutos civis de imóveis integrantes do patrimônio comum, a exemplo das salas de
n. 701, 706, 1008 e 1116, todas situadas no Edifício Mondrian Trade Center, em
Belo Horizonte – MG, e do apartamento n. 503 do Edifício Alvorada, também
localizado na capital mineira, esteando-se em tais argumentos para requerer a
restituição, pelo autor/reconvindo, de metade do valor de R$ 59.423,83
(cinquenta e nove mil e quatrocentos e vinte e três reais e oitenta e três
centavos), a título de meação dos frutos percebidos pelo varão. Justificara,
neste ponto, não ter tido acesso aos documentos comprobatórios da locação dos
imóveis enumerados anteriormente.
Requerera a reforma do decisório
hostilizado para que os bens adquiridos anteriormente ao vínculo matrimonial
fossem considerados bens reservados, nos termos dos artigos 1.659 e 1.661,
ambos do Código Civil, assim devendo ser enquadrados a casa n. 46, situada no
SGHIS 708, Bloco J, Asa Sul – Brasília/DF, adquirida, por ela, em 30/11/82, e o
apartamento n. 901 e a garagem n. 131, ambos do Edifício Stilo Residencial
Clube, situado na Rua Alecrim, Lote 06, Águas Claras – DF, que constituiria bem
subrrogado em razão da venda do imóvel San Remi, situado na SGHIN 705, bloco K
– Brasília – DF. Sob idêntico estofo material, requerera fosse estabelecido
lapso para a restituição, pelo autor/reconvindo, da metade dos valores dos
alugueres provenientes da locação dos apartamentos n. 301 do Edifício Cláudia
Lara, em Belo Horizonte-MG, e n. 2106 do Edifício Estação XVI, em Águas Claras
– DF, considerando-se o usufruto estabelecido em favor do casal, observada a
data da instituição até a ultimação da partilha.
Repisara a necessidade de serem meadas
as despesas a que acudira com exclusividade, totalizando o importe de R$
107.753,25 (cento e sete mil setecentos e cinquenta e três mil reais e vinte e
cinco centavos), utilizado para a realização de benfeitorias necessárias na
casa edificada nos lotes 47 e 49 do Condomínio Parque e Jardim das Paineiras,
que integra o acervo comum do casal. Com a mesma linha de argumentação deduz
pedido de ressarcimento de metade do valor pago a título de IPTU incidente
sobre os lotes enumerados e de taxas condominiais referentes aos lotes 50, 52 e
54 do mesmo condomínio.
Ao contrariar o recurso interposto pelo
autor[29],
a ré reprisara os argumentos alinhavados em contestação, pugnando pela mantença
do julgado hostilizado no pertinente à possibilidade de permanecer utilizando o
patronímico adotado por ocasião do casamento.
O autor, por sua vez, ao apresentar
contrarrazões ao apelo interposto pela ré[30],
requerera a manutenção do decisório guerreado exclusivamente no tocante ao
julgamento da reconvenção.
Ouvida a Procuradoria de Justiça,
consignara que não subsistira fato apto a legitimar sua interseção no processo
por se tratar de ação de divórcio de partes capazes e sem filhos[31].
Apelos tempestivos, preparados,
subscritos por advogados regularmente constituídos e processados na forma legal[32].
V O T O S
O
Senhor Desembargador TEÓFILO CAETANO - Relator
Cabíveis, tempestivos, preparados,
subscritos por advogados devidamente constituídos[33],
satisfazendo, pois, os pressupostos objetivos e subjetivos de recorribilidade
que lhes são próprios, conheço de ambos os recursos.
Cuida-se de ação de divórcio direto
aviada por P. G. V. de M. em
desfavor de J. D. A. B. V. de M. almejando
a decretação do divórcio do casal e a colocação de termo ao vínculo advindo do
casamento celebrado em 22 de setembro de 1987, sob o regime da comunhão
universal de bens, determinando-se que a virago volte a usar seu próprio
patronímico. Aperfeiçoada a relação processual e cumprido o itinerário
procedimental, durante o qual houvera a formulação de reconvenção e foram
colhidas provas orais, sobreviera sentença que, acolhendo os pedidos principal
e reconvencional, decretara o divórcio do casal e determinara a partilha do
patrimônio comum de forma igualitária, ressalvando à virago a possibilidade de
continuar usado o nome de casada. Inconformados, apelaram ambos os litigantes,
o autor pugnando pela reforma do decisório relativamente à permissão dada para
que a ré permaneça utilizando-se do patronímico adotado por força do enlace
matrimonial, e a ré exercendo a faculdade recursal com o fim de submeter ao
colegiado a pretensão de ver reformado o decisório quanto à data considerada
como paradigma para separação de fato dos litigantes, alteração que, no seu
entender, refletira diretamente na partilha de bens e frutos civis do casal,
cujo reconhecimento também postula.
Considerando que a ré suscitara defesa
processual, antes do exame do mérito deve ser examinada. Essa arguição, de
nulidade da sentença, fora agitada sob o argumento de que, conquanto tenha
aviado, na data da realização da audiência de instrução e julgamento e prolação
do provimento singular, cautelar de insanidade mental em desfavor do autor
almejando o reconhecimento da sua insanidade mental[34],
o fato processual não fora considerado, advindo a prolação da sentença que
resolvera a ação principal.
O alinhado pela ré/reconvinte, além de
carente de lastro legal, afigura-se destoante do regulado pelo estatuto
processual. O incidente que formulara, em verdade, é típico do processo
criminal, vez que, no processo civil, em havendo dúvida sobre a higidez mental
da parte, deverá ser aviado, em verdade, ação de interdição pelos legitimados a
assumirem essa postura. Considerando que a ré/reconvinte, na condição de
separada de fato, não está revestida de legitimação para reclamar a interdição
do autor/reconvindo, obviamente que não a assiste legitimação para formulação a
questão por via transversa, ou seja, via de cautelar de insanidade mental (CC,
arts. 1.768 e 1.775).
Conforme
inexorável, no momento em que aviara a ré, por vias transversas, a pretensão
destinada ao reconhecimento da incapacidade do autor/reconvindo, já estava
jurisdicionalizada a pretensão de desfazimento do vínculo matrimonial outrora
mantido pelos litigantes, não se sustentando o desenlace apenas na chamada posse do estado de separado de fato,
conforme vem reconhecendo a doutrina civilista. Segundo Guilherme Calmon Nogueira da Gama, professor e articulista do
Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, “as características
configuradoras da separação de fato são: i) o objetivo de dissolução da
sociedade conjugal, entendido como o fim do projeto familiar com o desfazimento
da comunhão plena de vida; ii) a instabilidade, ou melhor dizendo, a
estabilidade da instabilidade, observada quando a união mostra-se apta a ser
dissolvida durante o transcurso de, pelo menos, 1 ano (Art. 1572, §1º, CC - separação-falência);
iii) a continuidade do propósito de desfazimento da vida em comum (ausência de
reconciliação), materializado pela não convivência; iv) a notoriedade da
separação do casal, no sentido de a mesma ser de conhecimento do grupo social
no qual estão inseridos; e, a ausência de formalismo, que significa
inexistência de qualquer medida judicial relacionada diretamente à dissolução
da sociedade conjugal, sequer em sede cautelar (separação de corpos)"[35].
Considerando tais
características e já observado que, à época do aviamento da cautelar havia se
instalado o litígio quanto à dissolução da sociedade conjugal, que estava
dissolvida de fato, a ré/reconvinte já não mais ostentava a condição de cônjuge, detendo, ao invés, a
posse do estado de separada de fato, qualificando-se, sob essa moldura, como
ex-cônjuge, não obstante inexistisse sentença de decretação do divórcio na data
de ajuizamento daquela ação. Não sendo detentora do estado de cônjuge, não se
reveste de legitimidade para a propositura da ação de interdição,
principalmente quando formulada por vias transversas (CC, art. 1.768, inciso
II).
Aliás, a regra
insculpida no art. 1.775 do Estatuto Civil conduz a raciocínio ainda mais
rigoroso quanto à ausência de legitimidade da ré para o propósito a que se
intentara, forçando a conclusão de que nem mesmo se a considerássemos de posse
do estado de separada de fato seria ela parte legítima para a propositura da
ação de interdição, posto que tal dispositivo expressamente excluíra da
curatela o cônjuge separado de fato: “o
cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito,
curador do outro, quando interdito”. Em assim sendo, não há dúvidas de que
a mens legislatoris fora no sentido
de evitar o conflito de interesses entre o autor da ação de interdição e o
eventual interdito, o que seria de se presumir existente no caso da
estabilidade do desfazimento da vida em comum.
Para além desses
argumentos, a sentença que declara a interdição produz efeitos ex nunc, conforme reza o art. 1.773 do
CC, quedando os atos pretéritos sujeitos a eventual questionamento, por
demandarem a prova da insanidade mental que levara o agente à interdição ao
tempo do ato jurídico inquinado de viciado[36],
já que a capacidade é presumida e a incapacidade gerada por ausência de higidez
mental deve ser comprovada.
Ademais, o
pretendido pela ré/reconvinte com a pretensão que formulara, que não é
resguardar os interesses do varão, afigura-se inteiramente írrito. É que,
segundo ventilara, almejava, em verdade, reconhecer a incapacidade do cônjuge
com o escopo de colocar sob dúvida a higidez de negócios que teria entabulado.
Sucede que, além de a eventual interdição não estar provida de efeitos
retroativos, a ação de dissolução de vínculo matrimonial não é o palco adequado
para a invalidação de negócios sob o prisma da incapacidade civil do
contratante.
Além dessas inferências, sobreleva que,
não subsistindo dúvida sobre a higidez mental do autor/reconvindo nem
procedimento formulado por quem está revestido de legitimação destinado à sua
interdição, o aviamento da cautelar formulada pela ré/reconvinte não encerra
nenhum fato apto a interferir na elucidação da ação de divórcio.
Conseguintemente, o fato de ter alinhado a pretensão acautelatória, a par de
todas essas nuanças e, principalmente, da sua ilegitimidade e inadequação para
o alinhamento do pleito, é impassível de irradiar qualquer efeito no curso da
vertente ação, não implicando, portanto, nenhum vício na sentença. Rejeito, pois, a preliminar em tela.
Elucidada a preliminar suscitada e não
sobejando controvérsia acerca da dissolução da vida conjugal e da decretação do
divórcio, a apelação do autor, cujo objeto é exclusivamente à viabilidade de
reforma do decisório arrostado na parte em que facultara à ré/reconvinte
continuar usando o patronímico que adotara por ocasião do casamento. O autor,
na inicial e nas razões de recurso, invocara o parágrafo único do art. 1.573 do
Código Civil[37],
afastando a imputação de culpa pelo rompimento do vínculo matrimonial, bastando
a assertiva da impossibilidade de convivência, alinhado com a postura
legiferante adotada emenda Constitucional 66/10, por meio da qual fora retirado
do sistema jurídico pátrio o instituto da culpa, antes exigida pelo Código
Civil, sustentando que, ainda assim, não subsiste justificativa para que a
ex-esposa continue usando do seu nome de família.
O alinhado pelo autor/reconvindo,
contudo, carece de sustentação. Com efeito, em não tendo a ré incorrido em
nenhuma conduta passível de humilhar e desonrar o ex-marido, tendo a dissolução
da vida em comum decorrido de iniciativa comum motivada por contingências
pessoais, deve-lhe ser resguardado o direito de continuar adotando o nome que
assumira por ocasião do casamento. É que, conforme emerge dos elementos coligidos,
o nome de família do ex-marido incorporara-se à sua personalidade, tanto que no
seu meio profissional é conhecida e identificada como J. D. V. de M., tendo
sido suprimida da sua identificação pessoal seus nomes de família. Sob essa
moldura, a preservação da identificação assumida deve ser preservada como forma
de ser prevenido que a ré, na atual fase da vida, reste desprovida da sua
identificação.
Conforme ministra o professor Sílvio
Venosa, “ao admitir a possibilidade de
separação sem alegação de culpa de qualquer dos cônjuges, o legislador aderiu
preferentemente à teoria do divórcio-remédio. A separação é concedida como
remédio para uma situação e não como punição. A separação por ruptura da vida
em comum há mais de um ano (art. 1.572) é situação presente em outras
legislações, com prazos variados. Trata-se também de separação-remédio que
busca solução para situação de fato. Não se declinam as causas. Basta que seja
comprovada a ruptura há mais de um ano e a impossibilidade de sua
reconstituição.”[38]
Conseguintemente, não se tratando de
hipótese de se vincular ao desfazimento do enlace as situações capitaneadas
pelo art. 1.573 do Código Civil – antes, tratando-se de divórcio-remédio, termo
cunhado pela doutrina –, e diante da nova disciplina da Emenda Constitucional
n. 66/10, a literalidade do disposto no caput
do art. 1.578 do CC não possui aplicação ao caso concreto, haja vista ter sido
a culpa expungida da ordem jurídica civil, tornando-se desnecessária a eleição
de uma hipótese de sanção para a ruptura do enlace que vinculara os litigantes,
possuindo o provimento jurisdicional postulado a função de conformar solução
jurídica à situação de fato já estabelecida.
Nessa linha argumentativa, inexistindo
culpa, há a subsunção da hipótese vertente às disposições do §2º do art. 1.578
do CC, que, já afastando os termos do caput,
abre ensanchas para que o julgador, longe da casuística dos incisos do art.
1.573 e, também, do art. 1.578, ambos do Código Civil, possa avaliar a
necessidade de entremear exceção à regra da manutenção, e não do retorno, do
nome do cônjuge ao patronímico adotado original e anteriormente à concretização
do vínculo matrimonial, utilizando-se, como balizadores, inclusive, os incisos
do próprio art. 1.578 daquele Estatuto Civil.
Em outras palavras, é um truísmo a
constatação de que o nome integra os direitos da personalidade merecendo tutela
e proteção legal, e que o novo Código Civil regulara de forma casuística a
permanência do uso do nome de casado após a extinção da vida conjugal pela separação
ou pelo divórcio, revogando o disposto no parágrafo único do artigo 25 da Lei
do Divórcio – Lei nº 6.515/77. De conformidade com a nova regulação dispensada
à questão pelo legislador codificado, em não se tratando de separação motivada
pela culpa de um dos consortes, é resguardado ao cônjuge, independentemente de
justificativa, consoante exigia o preceptivo invocado, optar pela permanência
do uso do nome de casado, consoante dispõe o § 2º do artigo 1.571 do vigente
Código Civil, cujo conteúdo deslinda-se adiante:
“Art. 1.571. A sociedade
conjugal termina:
(...)
§ 2o
Dissolvido o casamento pelo divórcio direto ou por conversão, o cônjuge poderá
manter o nome de casado; salvo, no segundo caso, dispondo em contrário a
sentença de separação judicial.”
Aludida faculdade é corroborada pelo
legislador codificado ao regular a questão atinente ao uso do nome na hipótese
de a separação do casal ter derivado da culpa de um dos cônjuges, pois, após
assinalar que o cônjuge culpado perde o direito de usar o sobrenome do outro
consorte, ressalvara que, nas demais hipóteses, ou seja, naquelas em que a
ruptura da vida conjugal não derivara da culpa exclusiva de um dos cônjuges, é
cabível a opção pela conservação do nome de casado, conforme se afere do
disposto no § 2º do artigo 1.578 do Código Civil, verbis:
“Art. 1.578. O cônjuge declarado culpado na ação de separação
judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente
requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar:
(...)
§ 2o Nos demais casos caberá a opção pela
conservação do nome de casado."
Da regulação dispensada ao nome pelo
legislador codificado deriva, então, a constatação de que o retorno do uso do
nome de solteiro em razão da decretação da extinção do vínculo conjugal não
encerra corolário lógico da resolução definitiva do liame, tampouco a
preservação do uso do patronímico incorporado por ocasião do casamento reclama
opção justificada. Ao contrário, em não se tratando de separação motivada, ao
cônjuge que incorporara o patronímico do outro consorte por ocasião do
casamento é resguardada a faculdade de optar pela manutenção do nome de casado
ou, ainda, optar por utilizar o nome de solteiro. Essa faculdade, obviamente,
derivando de direito personalíssimo, por integrar os atributos da
personalidade, somente pode ser manifestada e exercitada pelo cônjuge.
Consoante abalizado escólio de Maria
Berenice Dias[39],
verbis:
“(...)
o nome não é propriedade de ninguém. O só fato de identificar a ascendência
familiar não o torna de uso exclusivo de quem o adquiriu ao nascer. Se adotou
um novo nome ao casar, o nome passou a ser seu, e não mais exclusivamente do
outro. Tornou-se um dos elementos do seu direito à identidade. Assim, quando do
fim do casamento, nada justifica submetê-lo aos caprichos do ex- cônjuge.”
Os argumentos alinhados, aliás,
encontram ressonância em precedentes originários desta egrégia Casa de Justiça
ao enfocarem a questão atinente à preservação do nome de casado em razão da
decretação do divórcio, conforme asseguram os arestos adiante ementados, hábeis
a manter a sentença no ponto impugnado:
“CONVERSÃO
DE SEPARAÇÃO EM DIVÓRCIO. PRETENSÃO DO VARÃO DE QUE A MULHER PERCA O SOBRENOME
QUE ADOTOU QUANDO DO CASAMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
Após
a promulgação da EC 66/10 o instituto da separação desapareceu do sistema
jurídico pátrio e, com isso, a teoria da culpa esvaiu-se. A mantença ou a
mudança do nome, como atributo da personalidade, passou a depender
exclusivamente da vontade de quem o adotou.”
(Acórdão n. 549107, 20090710355058APC, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma
Cível, julgado em 16/11/2011, DJ 22/11/2011 p. 95)
“CIVIL - DIVÓRCIO DIRETO - DISSOLUÇÃO
DO VÍNCULO MATRIMONIAL - MANUTENÇÃO DO NOME DE CASADA PELO CÔNJUGE VIRAGO -
POSSIBILIDADE (ART. 1.571, § 2º, CC/2002) - DIREITO PERSONALÍSSIMO - REVELIA -
CURADORIA ESPECIAL - RECURSO PROVIDO. 1.O § 2º do art. 1.571 do CC prevê a
possibilidade de manutenção do nome de casado pelo cônjuge no caso de divórcio
direto. 2. 3.A Curadoria Especial pode defender direito personalíssimo da parte
revel que possui sobrenome do outro cônjuge há mais de 30 (trinta) anos. 4.
5.Recurso provido.” (TJDF,
3ª Turma Cível, Apelação Cível n.º 2008031016086-0 APC DF, Reg. Int. Proces.
366110, relator Desembargador João Mariosa, data da decisão: 08/07/2009,
disponibilizada no Diário da Justiça eletrônico de 23/07/2009, pág. 66)
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - DIVÓRCIO
DIRETO LITIGIOSO - PATROMÍNICO DO VARÃO - UTILIZAÇÃO PELA MULHER -
POSSIBILIDADE.
- Assegura-se ao cônjuge virago, quando
da decretação do divórcio, manter o uso do patronímico do ex-marido, se
importar em evidente prejuízo para sua identificação, salvo em havendo novas
núpcias quando deverá renunciá-lo.” (Acórdão
n. 293715, 20060110931524APC, Relator DÁCIO VIEIRA, 5ª Turma Cível, julgado em
14/11/2007, DJ 28/02/2008 p. 1840)
Conseguintemente,
aferido que a ré/reconvinte, além de não ter incorrido em qualquer fato apto a
desonrar o nome que assumira, o incorporara como elemento inerente à sua
personalidade, deve-lhe ser resguardada, ante a opção que manifestara, a
continuidade do uso do nome de casada após a dissolução do vínculo matrimonial.
O apelo do autor/reconvindo deve,
portanto, ser desprovido.
Elucidado o apelo
do autor, passo ao exame do recurso aviado pela ré.
De início, convém
reprisar que, nas razões recursais, a ré aduzira que a data a ser considerada
para a separação de fato dos litigantes seria maio de 2010, pois, mesmo
residindo separadamente, teriam mantido relacionamento íntimo com o fim de se
reconciliarem. O marco definido pelo douto julgador a quo, dezembro de 2007, corresponderia ao período em que o casal
litigante deixara de coabitar. Conquanto a coabitação seja um dos deveres
matrimoniais, a separação de fato não pode ser presumida exclusivamente com
base nesse instituto, uma vez não se trata de prova inconteste do desfazimento
da vida em comum do casal, à medida que sofre temperamentos já consolidados
pela doutrina civilista especializada.
A articulista Fernanda Paes Leme Peyneau Rito,
analisando o rompimento da coabitação como requisito para a configuração da
separação de fato, esclarecera que
“sobre o requisito em
comento cabe a observação de que a separação pode ter inicialmente como causa
um justo motivo, mas, pode se prolongar a permitir a presença de todos os
demais requisitos e configurar a separação de fato, ou seja, pode também ser
relativizada.”[40].
Alinhada essa ressalva, o cotejo dos elementos coligidos não enseja apreensão
diversa da extraída pela sentença no sentido de que o mês de dezembro de 2007
efetivamente fora termo da vida em comum dos litigantes.
Aliado ao fato de
que, conforme assimilado pela ré/reconvinte, efetivamente a partir de então os
litigantes deixaram de coabitar sob o mesmo teto, a despeito de continuarem
mantendo relacionamento, inclusive profissional, pois desempenhara a atribuição
de assessora do gabinete do autor/reconvindo até abril de 2008, quando viera
ele a se aposentar[41],
não houvera, desde então, a retomada da vida comum com o propósito de ser
preservada o relacionamento conjugal e o casamento. Com efeito, a partir de
então, desfeito os vínculos que determinavam a preservação da vida conjugal, os
litigantes, a despeito de terem trocado correspondência, por meio da qual
externaram laços afetivos[42],
e de ter a ré/reconvinte prestado auxílio ao autor/reconvindo quando viera a
ser internado[43],
jamais voltaram a viver ou conviver como se se tratassem de marido e mulher.
É que, agregado ao
fato de que deixaram de conviver sob o mesmo teto, os litigantes jamais
manifestaram interesse em retomar a vida em comum ou de preservar o casamento.
Tanto é assim que, como corolário da separação de fato que se implementara no
mês de dezembro de 2007, o autor formulara a pretensão destinada à colocação de
termo ao vínculo no mês de outubro de 2010. Sob essa moldura de fato e não
havendo nenhum elemento apto a ensejar que efetivamente os litigantes
preservaram o vínculo que os enlaçara após terem deixado de coabitar sob o
mesmo teto, deve prevalecer a apreensão que emerge dessa circunstância, que
enseja a constatação de que, separados de fato, efetivamente restara dissolvida
a vida em comum. Esse
fato, contudo, é irrelevante para o desenlace da pretensão formulada pela ré
almejando a inserção no acervo patrimonial de bens que não foram partilhados.
Conforme alinhado,
a ré/reconvinte almejara a partilha dos seguintes bens e obrigações:
I) Lotes n. 47 e 49 do Condomínio
Parque e Jardim das Paineiras, Fazenda Taboquinha – Jardim Botânico – Lago
Sul/DF, sobre os quais se edificou uma casa residencial de valor estimado em R$
543.681,61 (quinhentos e quarenta e três mil seiscentos e oitenta e um reais e
sessenta e um centavos), conforme declaração de ajuste anual apresentada em
2010 pelo casal[44];
II) Apartamento n. 2106 do Lote 1250,
localizado na Avenida Castanheira – Águas Claras/DF, com 120 m² de área total e vaga
de garagem, escriturado em nome do filho do autor/reconvindo, Felipe Augusto
Monteiro Vaz de Mello, com usufruto vitalício do casal, avaliado em R$
250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais), consoante declaração de ajuste
anual apresentada em 2010; [45]
III) Apartamento n. 803, do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima n. 1324, Belo Horizonte/MG, ocupado
eventualmente pelo reconvindo e com valor aproximado de R$ 40.000,00 (quarenta
mil reais), na forma da declaração de ajuste anual apresentada em 2010[46];
IV) Apartamento n. 503 do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima n. 1324, Belo Horizonte/MG,
atualmente locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo e valor constante
da declaração de ajuste anual de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais)[47];
V) Apartamento n. 1502 do Edifício
Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima, n. 1324, Belo Horizonte/MG,
atualmente locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo e valor
constante de declaração de ajuste anual de R$ 100.000,00 (cem mil reais)[48];
VI) Sala n. 701 e respectiva vaga de
garagem, situada no edifício Mondrian Trade Center, Belo Horizonte/MG,
atualmente locado, com frutos revertidos em favor do reconvindo, e valor
constante de declaração de ajuste anual de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil
reais)[49];
VII) Apartamento n. 705 do Edifício
Leila, situado na Avenida José Ferreira Ferro n. 1415, Guarapari/ES,
eventualmente ocupado pelo reconvindo e equivalente a R$ 80.000,00 (oitenta mil
reais), conforme declaração anual de ajuste de 2010[50];
VIII) Apartamento n. 2401 e vagas de
garagem n. 166 e 181, todos situados no Condomínio Mirante das Águas,
localizado na Rua Alecrim, Lote 4, Águas Claras/DF, ocupado eventualmente pelo reconvindo
e correspondente a R$ 410.000,00 (quatrocentos e dez mil reais), conforme
declaração anual de ajuste de 2010 [51];
IX) Apartamento n. 901 do Edifício
Stilo Residencial Clube, situado na Rua Alecrim, Lote 06, bloco A e vaga de
garagem n.131, atualmente locado com frutos civis revertidos apenas em favor da
reconvinte, de valor aproximado de R$ 105.946,47 (cento e cinco mil e
novecentos e quarenta e seis mil e
quarenta e sete centavos), valor declinado na declaração de ajuste anual de
2010[52];
X) Sala n. 807 do Edifício Fashion
Center, situado na Rua Guajajaras n. 1470, Belo Horizonte, com frutos
revertidos apenas em favor do reconvindo, e valor constante de declaração de
ajuste anual no importe de R$18.000,00 (dezoito mil reais)[53];
XI) Apartamento n. 801 do Edifício
Residencial Jardim das Oliveiras, situado na Rua Rio das Mortes n. 170, Belo
Horizonte/MG, a ser escriturado em favor de Felipe Augusto Monteiro Vaz de
Mello, filho do reconvindo, supostamente adquirido por R$ 180.000,00 (cento e
oitenta mil reais), com recursos decorrentes da venda do apartamento n. 1807 do
bloco II do Edifício Fontana de Trevi, situado na Rua Mato Grosso n. 666, Barro
Preto, Belo Horizonte[54];
XII) apartamento nº 301 do Edifício
Residencial Cláudia Lara, situado na Avenida Flávio dos Santos n. 330, Bairro
Floresta, Belo Horizonte/MG, atualmente locado, com frutos revertidos em favor
de F. A. M. V. M., filho do reconvindo, e de valor atribuído pela reconvinte no
montante de R$220.000,00 (duzentos e vinte mil reais)[55];
XIII) dívidas quitadas exclusivamente
pela reconvinte[56],
oriundas de manutenção de patrimônio comum, no valor apurado de R$195.522,02
(cento e noventa e cinco mil quinhentos e vinte e dois reais e dois centavos);
XIV) dívida do
casal, avaliada em R$ 33.365,11 (trinta e três mil trezentos e sessenta e cinco
reais e onze centavos), decorrentes da inadimplência das taxas de condomínio
dos lotes n. 47 e 49[57],
ambos situados no Condomínio Parque e Jardim das Paineiras, Fazenda Taboquinha,
Jardim Botânico – Lago Sul/DF, cujo pagamento foi retardado até o ano de 2006,
quando, supostamente, a reconvinte passou a efetuar, por conta própria, os
pagamentos mensais.
A seu turno, a
sentença determinara a partilha dos seguintes imóveis e obrigações, verbis:
i) direitos inerentes aos Lotes 47
(fls. 520-522) e 49 localizados no Condomínio Parque e Jardim das Paineiras,
Fazenda Taboquinha, Bairro Jardim Botânico, Lago Sul, adquiridos em 18/09/1995,
pendente de regularização;
ii) apto. 803 do Edifício Alvorada,
Avenida Augusto Lima, 1324, Belo Horizonte MG, adquirido em 03/02/2006 (fls.
586-588);
iii) apto. 503 do Edifício Alvorada,
Avenida Augusto Lima, 1324, Belo Horizonte MG, adquirido em 22/09/2006 (fls.
589-590);
iv) sala 701, do Edifício Mondrian
Trade Center, Belo Horizonte MG, adquirido em 01/02/2006 (fls. 597-598);
v) apto. 705 do Edifício Leila, Avenida
José Ferreira Ferro, 1415, Guarapari/ES, adquirido em 12/07/2007 (fls. 578);
vi) direitos inerentes ao Apto. 2401 e vagas de garagem 166 e 181 do Condomínio
Mirante das Águas, rua Alecrim, Lote 04, Águas Claras, adquirido em 30/01/2007,
(fls. 508 e cessão de direitos fls. 54-56 e 98-100);
vii) direitos inerentes ao Apto. 901 e
garagem 131 do Edifício Stilo Residencial Clube, Rua Alecrim, Lote 06, bloco A,
adquirido em 16/06/2007; (fls. 507, promessa de compra e venda, fls. 533-540);
viii) usufruto dos apartamentos descritos nas certidões de fls. 509-510 e
580-582;
ix) dívida de R$33.365,11 (trinta e
três mil e trezentos e sessenta e cinco reais e onze centavos).
A pretensão da ré/reconvinte em
incorporar ao acervo partilhável bens não transcritos em nome dos litigantes,
mas em nome de terceiro e dos filhos do autor/revonvindo, carece de substrato.
É que, quanto aos imóveis excluídos da partilha por estarem em nome dos filhos
do varão, observa-se o seguinte:
(i) o apartamento n. 2106 do Lote 1250,
localizado na Avenida Castanheiras – Águas Claras/DF, com 120 m² de área total e vaga
de garagem, está escriturado em nome do filho do autor/reconvindo, Felipe
Augusto Monteiro Vaz de Mello, com usufruto vitalício do casal;[58]
ii) a Sala n. 807 do Edifício Fashion
Center, situado na Rua Guajajaras n. 1470, Belo Horizonte, está transcrita em nome Priscila Hallack
Gouvêa Mascarenhas[59];
iii) o apartamento n. 801 do Edifício
Residencial Jardim das Oliveiras, situado na Rua Rio das Mortes n. 170, Belo
Horizonte/MG, está escriturado em nome do filho do autor/reconvindo, Felipe
Augusto Monteiro Vaz de Mello, com usufruto vitalício do casal[60];
iii) o apartamento nº 301 do Edifício
Residencial Cláudia Lara, situado na Avenida Flávio dos Santos n. 330, Bairro
Floresta, Belo Horizonte/MG, atualmente locado, está transcrito em nome de
Fernando Antônio Monteiro Vaz de Mello, filho do reconvindo[61].
Conseguintemente, não estando aludidos
imóveis transcritos em nome dos litigantes, não podem ser partilhados, sob
pena, inclusive, de se dispor de patrimônio pertencente a terceiros à margem do
devido processo legal. Se o caso, deverá a pretensão ser formalizada sob o
prisma do contraditório e do devido processo legal, notadamente porque a
partilha a ser decretada tem como premissa a detenção, pelos litigantes, da
qualidade de proprietários dos bens partilhados. Elidida essa premissa, não se
afigura viável o acolhimento da pretensão formulada pela ré/reconvinte
almejando a inserção na partilha dos imóveis acima individualizados.
De outra parte, o imóvel representado
pelo apartamento n. 1502 do Edifício Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima,
n. 1324, Belo Horizonte/MG[62],
conquanto tenha sido transcrito em nome do autor/reconvindo após a separação de
fato, deve ser inserido no monte partilhável. É que, mantido o vínculo formal,
presume-se que a aquisição derivara da concorrência de ambos os litigantes,
devendo ser privilegiado, portanto, o regime de bens adotado. Assim é que esse
imóvel deve ser inserido no monte partilhável, devendo a sentença, quanto ao
ponto, ser retificada. Esse, aliás, é o entendimento perfilhado em uníssono por
esta egrégia Casa de Justiça, conforme se afere do julgado adiante sumariado:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - DIVÓRCIO
DIRETO LITIGIOSO - PARTILHA - BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO -
PARTILHA. - A SOCIEDADE CONJUGAL SÓ CHEGA A TERMO PELA VIA DA SEPARAÇÃO
JUDICIAL OU PELO DIVÓRCIO. - A SEPARAÇÃO DE FATO NÃO DESFAZ O VÍNCULO CONJUGAL,
CUJA CONSTÂNCIA, NO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS, INDUZ À PRESUNÇÃO DO
ESFORÇO COMUM DOS CÔNJUGES NA CONSTITUIÇÃO DO PATRIMÔNIO DO CASAL.”
(Acórdão n. 250667, 20030610020880APC,
Relator DÁCIO VIEIRA, 5ª Turma Cível, julgado em 07/11/2005, DJ 24/08/2006 p.
130)
No tocante ao pleito de reforma do
decisório hostilizado para que os bens adquiridos anteriormente ao vínculo
matrimonial[63]
fossem considerados bens reservados, na forma do que dispõem os artigos 1.659 e
1.661, ambos do Código Civil, o aduzido pela ré afigura-se carente de resplado
material. Os dispositivos legais invocados regulamentam o regime da comunhão
parcial de bens, ao passo que os direitos patrimoniais advindos do matrimônio
que convolara são regidos pelos artigos 1.667 a 1.671, todos do Código Civil de 2003 e
com respectiva correspondência no Código pretérito – em obediência ao princípio
tempus regit actum –, somente podendo
ser excluído da massa patrimonial a ser meada o bem que se subsumir a uma das
hipóteses descritas nos incisos do art. 1.668 do Código Civil vigorante, não
havendo, pois, que se falar na pretensa incomunicabilidade dos bens adquiridos
anteriormente à convolação das núpcias por não se enquadrar o havido em nenhuma
das ressalvas contempladas pelo legislador atual e pretérito.
Ademais, consoante
já cristalizado pela jurisprudência desta Corte de Justiça, o instituto do bem
reservado deixara de compor o mundo jurídico em razão de não ter sido
recepcionado pela Constituição Federal de 1988, que, a seu turno, igualara os
direitos e as obrigações dos homens e das mulheres, conforme estratificado na
ementa a seguir transcrita:
“CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DE
DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO C/C PEDIDO DE RESERVA DE BEM E PARTILHA. PRODUÇÃO DE
PROVA TESTEMUNHAL. INDEFERIMENTO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO AGRAVO
RETIDO. INCIDÊNCIA DO REGIME DE BENS DISPOSTO NO CÓDIGO CIVIL DE 1916. BEM
RESERVADO. NÃO RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL
DE BENS. COMUNHÃO DE TODOS OS BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO, AINDA
QUE A TÍTULO ONEROSO SUPORTADO POR APENAS UM DOS CÔNJUGES. SENTENÇA CONFIRMADA
POR OUTROS FUNDAMENTOS.
1 - Incide o regime de bens disposto no
Código Civil de 1916 ao casamento celebrado sob sua vigência. Inteligência do
artigo 2.039 do Código Civil de 2002.
2 - A Constituição Federal de 1988, ao
proclamar a igualdade de homens e mulheres quanto aos direitos e deveres
referentes à sociedade conjugal (artigo 226, § 5º), não recepcionou o artigo
246 do Código Civil anterior que assegurava à mulher casada que exercesse
profissão lucrativa o direito de constituir como bens reservados o produto de
seu trabalho e os bens com ele adquirido.
3 - No regime de comunhão parcial de
bens, após o enlace matrimonial passam a pertencer aos cônjuges todos os bens
que forem adquiridos na constância do casamento, ainda que a título oneroso em
nome de apenas um dos consortes. Inteligência dos artigos 271, inciso I, do
Código Civil de 1916 e 1.660, inciso I, do Código Civil de 2002.
4 - Incontroverso nos autos que a
aquisição do bem imóvel ocorreu na constância do matrimônio, sem que sua causa
de aquisição preexista ao casamento, integra a comunhão mesmo que o seu
pagamento tenha sido efetuado por apenas um dos consortes.
5 - Ante o regime legal de comunhão
parcial de bens, resulta inócua a pretensão de produção de prova oral com o
escopo de comprovar alegada ausência de contribuição do cônjuge varão na
formação do patrimônio em comum desde o início do casamento.
Agravo Retido desprovido.
Apelação Cível da Autora desprovida.” (Acórdão n. 384872, 20080110688320APC,
Relator ANGELO PASSARELI, 2ª Turma Cível, julgado em 21/10/2009, DJ 12/11/2009
p. 59)
De sua parte, o aduzido acerca da
suposta sonegação de frutos civis de imóveis integrantes do patrimônio comum do
casal[64]
também ressente-se de sustentação. A eventual sonegação ou dilapidação do
patrimônio comum no decorrer da separação de fato, ao argumento de incorreta
administração dos bens, há de ser corretamente deduzido em procedimento
próprio, na forma das regras insertas nos artigos 1.642 a 1645, todos do
Código Civil[65].
A meação deve ser processada mediante o procedimento especial de inventário e
partilha, consoante se depreende do estampado no §1º do artigo 1.121 do Código
de Processo Civil, cuja expressão é a seguinte:
Ҥ
1o Se os cônjuges não acordarem sobre a partilha dos bens, far-se-á esta,
depois de homologada a separação consensual, na forma estabelecida neste Livro,
Título I, Capítulo IX.”
Sobreleva notar
que, restando litigiosa a partilha, vez que não aferido quais bens integram ou
não o patrimônio comum e se são ou não passíveis de partilha ante a dissolução
do vínculo conjugal havido entre os litigantes, a dissolução do dissenso deve
ser resolvida por meio da via apropriada para esse desiderato, a saber, a ação
de partilha, em cujo bojo deverão ser arrolados os bens comuns e decidida sua
destinação. Elucidativo a respeito do tema é o escólio de Cristiano Chaves de
Farias e de Nelson Rosenvald, verbis:
“Não
havendo disposição expressa no acordo de vontades para o divórcio consensual ou
ausente deliberação judicial sobre o tema quando litigiosa, presumir-se-á a
permanência, em condomínio do patrimônio comum do casal – o qual poderá ser
partilhado posteriormente, de acordo com a vontade das partes em extinguir o
condomínio, de acordo com as regras do art. 1320 do Codex, através de escritura
pública ou de procedimento judicial de partilha, conforme previsão do art.
1.321 da lei Civil – que trata de um procedimento especial de partilha, aplicável
à dissolução do condomínio, por força de disposição da codificação civil.[66]”
Sob
idêntica linha de raciocínio é conveniente ser trazida à colação, outrossim, a
lição desenvolvida a respeito da matéria por Maria Berenice Dias, elucidando o
rito adequado para a dissolução sem consenso da massa de patrimônio comum do
casal extinto:
“Quando,
na separação consensual, os cônjuges não chegam a um consenso sobre o destino
do acervo comum, a partilha dos bens seguirá o rito do inventário e do
arrolamento (CPC 1.121 §1º e 1.031). Aplicável tal dispositivo também para a
hipótese de separação judicial litigiosa e de ação de divórcio. Havendo
consenso sobre a partilha, esta pode ser feita por escritura pública (CPC 475-E
e 475-F). Como o rito do inventário e do arrolamento não comporta questões de
alta indagação (CPC 982 a
1.045), usualmente se relega a identificação do patrimônio a ser partilhado
para a fase de liquidação de sentença.[67]”
Alfim, a pretensa meação das despesas
com benfeitorias a que supostamente acudira a ré com exclusividade nos lotes 47
e 49 do Condomínio Parque e Jardim das Paineiras, bem assim quanto ao pedido de
ressarcimento de metade do valor pago pelo IPTU incidente sobre os lotes
enumerados, taxas condominiais referentes aos lotes 50, 52 e 54 do mesmo
condomínio, também carece de sustentação. Assim como se presumem adquiridos na
constância do matrimônio ou por fruto de esforço comum todo bem até a data
estabelecida como paradigma para a separação dos litigantes, presume-se que os
recursos empregados pelos ex-cônjuges na administração dos bens comuns o foram
em decorrência de planejamento da vida em comum e da constituição do patrimônio
que buscam partilhar. Neste sentido, manifestação desta Casa de Justiça:
“DIVÓRCIO LITIGIOSO. REGIME DA COMUNHÃO
UNIVERSAL DE BENS. DIREITOS E OBRIGAÇÕES. PARTILHA.
O regime da comunhão universal de bens
tem como nota característica serem comuns todos os bens dos cônjuges adquiridos
a título oneroso na constância, ou não, do casamento, devendo, pois, no
divórcio, os bens comuns do casal, bem assim as dívidas, ser partilhadas na
proporção de 50% (ciquenta por cento) para cada um, a fim de se prevenir o
enriquecimento desprovido de causa subjacente legítima de quaisquer das
partes.” (Acórdão
n. 549097, 20100110653293APC, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, julgado
em 16/11/2011, DJ 22/11/2011 p. 98)
De todo o
expendido, portanto, resta patente a necessidade de manutenção, excetuado tão
somente a exclusão da partilha do imóvel que fora adquirido ainda na constância
formal do casamento, por ser presumível que toda a massa patrimonial fora
constituída por esforço comum e deve ser meada à razão de 50% (cinquenta por
cento) para cada ex-cônjuge, inexistindo qualquer bem incomunicável a ser
excluído do rateio. De outro lado, mantém-se o decisório nos demais termos
prolatados, por se aferir a impossibilidade de se agasalhar, nesta seara
recursal, a pretensão atinente a eventual sonegação ou dilapidação de
patrimônio do casal, intuito que, à vista da litigiosidade havida entre os
litigantes, deve ser postulado em procedimento próprio, a teor das normas
insertas nos artigos 1.642 a
1645, todos do Código Civil, bem assim no tocante ao pleito de restituição de
valores despendidos com benfeitorias no bem do casal, uma vez presumidos que os
recursos empregados pelos ex-cônjuges na administração dos bens comuns derivam
de esforço comum, entendimento também aplicável quanto aos bens adquiridos na
constância do matrimônio.
Esteado
em tais fundamentos, nego provimento ao recurso do autor/reconvindo e dou
parcial provimento ao recurso da ré/reconvinte, tão somente para, reformando a
v. sentença hostilizada quanto ao ponto, inserir no acervo patrimonial que deve
ser rateado o apartamento n. 1502 do Edifício Alvorada, situado na Avenida
Augusto Lima, n. 1324, Belo Horizonte/MG, mantendo, quanto ao mais, o decidido,
inclusive quanto ao rateio das verbas de sucumbência.
É como voto.
O
Senhor Desembargador FLAVIO ROSTIROLA - Revisor
Com o Relator.
A Senhora Desembargadora ANA CANTARINO - Vogal
Com o Relator.
D E C I S Ã O
CONHECER
DOS RECURSOS, REJEITAR A(S) PRELIMINAR(ES) E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO
APELO DO AUTOR E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO DA RÉ, UNÂNIME .
[1] Certidão
de casamento – fl. 12.
[2] Fls.
24/35
[3] Fls.
70/81
[4] Fls.
454/459
[5]
Documento de fl. 513
[7] Documento de fl. 590
[8] Documento de fl. 584
[9] Documento de fl. 598
[10] Documento de fl. 578
[11]
Instrumento particular de cessão de direitos – fls. 98/101 e registro geral de
imóvel – fl. 508
[12] Documentos
de fls. 507 e 533/539
[13]
Documento de fls. 595/596
[14]
Documento de fl. 592
[15]
Certidão de registro de imóveis de fl. 103 e documento de fls. 581/582
[16]
Documentos de fls. 105/113
[17]
Documentos de fls. 189/198
[18]
Documentos de fls. 263/433
[19]
Fl. 116
[20] Fls.153/154
[21]
Fls. 447/450
[22]
Fls. 160/169
[23]
Fls. 724/730
[24]
Fls. 796/802 – guia de preparo de fl. 803
[25]
Fls. 814/830 – guia de preparo de fl. 832
[26]
Processo nº 2011.01.1.212552-5
[27] Apartamento 1502, do
Edifício Alvorada, situado na Avenida Augusto Lima, 1324, Belo Horizonte-MG e a
sala nº 807 do Edifício Fashion Center, Rua Guajajaras, 1470, Belo
Horizonte-MG, pertencentes aos litigantes, mas registrado apenas em nome do
autor; apartamento nº 1502[27] do Edifício Alvorada, na
Avenida Augusto Lima, 1324, Belo Horizonte/MG.
[28] Fls.
454/459.
[29]
Fls. 902/913
[30]
Fls. 930/947
[31] Fls.
957/959.
[32]
Procuração do advogado do autor – fl. 11; procuração advogado da ré – fl. 21.
[33] Procuração do advogado do autor – fl. 11;
procuração advogado da ré – fl. 21. Apelação do autor fls. 796/802 – guia de
preparo de fl. 803; apelação da ré fls. 814/830 – guia de preparo de fl. 832
[34]
Processo nº 2011.01.1.212552-5.
[35]
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Separação
de fato e ética no direito de família. in A ética da convivência familiar. Sua
efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense, 2006, PP
73-99.
[36]
STF, Ag. 21.531, rel. Min. ribeiro da Costa – 8/9/51 .
[37] Art. 1.573. Podem
caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos
seguintes motivos: (...) Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos
que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.
[38]
Venosa, Sílvio de Salvo. Direito Civil, direito de família. 10ª ed. Ed. Atlas, pp. 194/195.
[39]
Manual de Direito das Famílias. 8ª Ed, rev., atual. e ampl. Editora Revista dos
Tribunais: São Paulo, 2011, p. 317.
[40] Efeitos patrimoniais da separação de fato.
Disponível em www.ibdfam.org.br
[41]
Fls. 884/886
[42]
Fls. 877/883
[43]
Fl. 887 e depoimentos de fls. 732 e 733
[44]
Fls. 454/459
[45]
Documento de fl. 513
[46]
Documento de fls. 586/588
[47] Documento de fl. 590
[48] Documento de fl. 584
[49] Documento de fl. 598
[50] Documento de fl. 578
[51]
Instrumento particular de cessão de direitos – fls. 98/101 e registro geral de
imóvel – fl. 508
[52]
Documentos de fls. 507 e 533/539
[53]
Documento de fls. 595/596
[54]
Documento de fl. 592
[55]
Certidão de registro de imóveis de fl. 103 e documento de fls. 581/582
[56]
Documentos de fls. 105/113
[57]
Documentos de fls. 189/198
[58]
Documento de fl. 513
[59]
Documento de fls. 595/596
[60]
Documento de fl. 592
[61]
Certidão de registro de imóveis de fl. 103 e documento de fls. 581/582
[62] Documento de fl. 584
[63] Nos quais se englobam a casa n. 46, situada
no SGHIS 708, Bloco J, Asa Sul – Brasília/DF, adquirida em 30/11/82 pela ré; e o
apartamento n. 901 e a garagem n. 131, ambos do Edifício Stilo Residencial
Clube, situado na Rua Alecrim, Lote 06, Águas Claras – DF, que constituiria bem
sub-rogado em razão da venda do imóvel San Remi, situado na SHIN 705, bloco K –
Brasília – DF.
[64] A
exemplo das salas n. 701, 706, 1008 e 1116, todas situadas no Edifício Mondrian
Trade Center, em Belo
Horizonte – MG, e do apartamento n. 503 do Edifício Alvorada,
também localizado na capital mineira.
[65] Art. 1.642. Qualquer que
seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: I -
praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao
desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecida no inciso I do art.
1.647; II - administrar os bens próprios; III - desobrigar ou reivindicar os
imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu consentimento ou sem
suprimento judicial; IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação,
ou a invalidação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do
disposto nos incisos III e IV do art. 1.647; V - reivindicar os bens comuns,
móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino,
desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes,
se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos; VI - praticar todos
os atos que não lhes forem vedados expressamente.
Art. 1.643. Podem os cônjuges, independentemente de autorização um
do outro: I - comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia
doméstica; II - obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas
coisas possa exigir.
Art. 1.644. As dívidas contraídas para os fins do artigo
antecedente obrigam solidariamente ambos os cônjuges.
Art. 1.645. As ações fundadas nos incisos III, IV e V do art.
1.642 competem ao cônjuge prejudicado e a seus herdeiros.
[66] -
FARIAS, Cristiano Chaves de. E ROSENVALD, Nelson. “Direito das famílias”. 3. ed. RJ: Editora Lumen Juris, 2011. p.415.
[67]
DIAS, Maria Berenice. “Manual de direito das famílias”. 5ª. ed. SP: RT, 2009.
p. 300.
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