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segunda-feira, 6 de agosto de 2012

NULIDADE DE TESTAMENTO. TESTAMENTO ELABORADO POR TABELIÃO.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de
APELAÇÃO CÍVEL n° 182.609-4/3-00, da Comarca de SÃO PAULO, em
que são apelantes e reciprocamente apelados J.A.A e OUTROS, L. F. DA S.C.  (TESTAMENTEIRO) E C.DE L. C. A.:
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a
seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS RÉUS,
PREJUDICADO O DOS AUTORES, CONTRA O VOTO DO RELATOR QUE
NEGAVA PROVIMENTO AO DOS RÉUS E PROVIA O DOS AUTORES. FARÃO
DECLARAÇÃO DE VOTO O RELATOR SORTEADO E O
 JUIZ", de conformidade com o relatório e voto do Relator Designado, que
integram este acórdão.
O julgamento teve a participação dos
Desembargadores CARLOS ROBERTO GONÇALVES (Presidente, sem
voto), WALDEMAR NOGUEIRA FILHO e FLÁVIO PINHEIRO, vencido.
São Paulo, 14 desmaio/de 2002.
ALFREDO MIGLIORE
Relator Designado


TESTAMENTO - Nulidade - Não se
reveste de nulidade testamento
elaborado pelo Tabelião, consoante
minuta do testador, e que, perante
as testemunhas instrumentárias, foi
lido pelo Tabelião, com ratificação
expressa do testador - Exegese do
art 1.632,1 do C.C.
TESTAMENTO - Anulabilidade
perseguida por doença mental do
testador - Se o laudo retrospectivo
não traz certeza absoluta sobre ser
o "de cujus" portador de doença de
Binswanger e do grau de declínio
cognitivo quando do ato notarial, na
dúvida, prevalecerá a vontade
indesmentida do testador - Provas
conflitantes desautorizadoras de
nulidade.
LIBELO - Não constando do libelo
pedido de nulidade da cláusula
excludente de legítimas e da doação
infringente do art 1.176 do C.Ci.,
fica a ressalva de que deve a
primeira ser discutida nos autos de
inventário e a segunda, ou nestes
ou em ação própria - Recurso dos
réus e testamenteiro providos e
prejudicado o dos autores.
Trata-se de ação ordinária proposta por JAA
e outros em face de CLCA e Outro,
buscando seja anulado testamento deixado por AA,
fundamentada a ação nos artigos 1.627, II e III, 1.632, I e II, e
parágrafo único do ait 1.634, do Código Civil, julgada procedente pela
r. sentença de primeiro grau (fls. 1.702/1.715), condenados os réus ao
pagamento de custas processuais, inclusive honorários do perito, bem
como a verba honorária fixada em 10% sobre o valor dado à causa,
corrigido este desde a data do ajuizamento, para efeito de cálculo.
Irresignados, apelaram os autores buscando majoração da
verba honorária, posto que a condenação deveria seguir os
mandamentos do disposto no §4° do art. 20 do C.P.C., vez a
condenação imposta, na base de 10% sobre o valor da causa,
apresenta-se irrisória e não reflete o grau de zelo profissional, a
natureza e a importância da causa.
Apelou também LFS (fls. 1.809/1.854)
buscando seja reformado o r. decisório, alegando, em síntese, no
recurso, a inexistência de qualquer vício no testamento efetuado pelo
falecido A.A.
Interpôs, também, recurso de apelação CLCA, sustentando,
em síntese, a inexistência de qualquer
vício a anular o testamento que ora se combate, bem como
sustentando que a sentença não enfrentou as críticas feitas pelos
réus, e seus assistentes técnicos, decidindo sem qualquer motivação
acerca do laudo pericial supra citado; a prova testemunhai foi
desvalorizada peta parcialidade do MM. Juiz, a despeito de sequer a
parte contrária ter contraditado alguma das testemunhas arroladas
pelo réu, além de repetir alguns dos argumentos invocados pelo
litisconsorte passivo.
Recursos regularmente processados, com as respectivas
respostas (fls.1.897/1.927; 1.943/1.946; 1.947/1.959).
Opinou a Procuradoria Geral de Justiça pela manutenção da
r. decisão recorrida (fls.1.989/1.994).
É o relatório.
Nulo não era o testamento. Foi este redigido pelo Tabelião,
no Cartório, conforme minuta que lhe foi apresentada pelo testador,
ocasião em que foi lida para o testador, confirmada na presença de
cinco (5) testemunhas.
O artigo 1.632 é expressivo, a respeito da validade do
testamento público:
"Sâo requisitos essenciais do testamento público:
Que seja escrito por oficial público em seu livro de
notas, de acordo com o ditado ou as declarações do testador, em
presença de cinco testemunhas.
E o Tabelião foi claro ao certificar: "Lavrei o presente
instrumento por me ser pedido, o qual, feito e sendo por mim lido, em
voz alta e clara ao testador, na presença de cinco testemunhas "
(fls.42)
A certidão do Tabelião é revestida de fé pública.
Presentes se encontravam quando da leitura do testamento
as testemunhas instrumentárias. E o próprio testador corrigiu, por duas
vezes, a minuta entregue ao tabelião, antes de ser passada no Livro
Próprio.
Não se pode esquecer que, impugnada com veemência a
incapacidade mental de quem testar, e com argumentos fortes, o ônus
da prova era dos autores, incumbida a eles a comprovação da referida
causa de anulabilidade testamentária, eis que, se anulado o ato de
última vontade, cabia-lhe o direito de recebimento dos legados
constantes no instrumento público de 20/05/1986 (fls.51/53).
Predominante, no caso, a regra do art. 333, I do C.P.C.. Ao
juiz cabe a análise das provas produzidas, sua interpretação,
fundamentando-a com os elementos de convicção constantes no
processo.
Ora, embora este Relator seja rigoroso quanto ao
cumprimento de requisitos para validade formal de um testamento, não
vejo como declarar-se a nulidade, se caracterizada perante o oficiai
público e testemunhas instrumentárias, a intenção do testador. E se
houve adimplemento das regras de direito objetivo constantes no texto
do art. 1.632 do C.Ci.
Neste sentido, pode-se adaptar o raciocínio esposado por
Washington de Barros Monteiro (Curso de Direito Civil - Direito das
Sucessões, vol. 6, pág. 112), reproduzido do processo
(fls. 1.848/1.849):
"O testamento deve ser lavrado de acordo com o ditado
ou as declarações do testador. Nada impede, todavia, se
apresente este perante o tabelião com minuta redigida pelo
advogado, ou recorra a notas e apontamentos particulares, para
melhor encaminhar o pensamento e bem enunciar a sua última
vontade".
E, também, o pensamento de Caio Mário da Silva Pereira
(Instituições de Direito Civil, vol. VI/159, ed. 1974, transcrito de fls.
1.890):
"O testador deverá ditar as suas declarações, podendo
valer-se de notas ou mesmo de minuta inteiramente redigida.
Neste último caso, não basta a transposição desta para o livro do
tabelião; é essencial a declaração oralmente feita pelo testador.
Mas se trouxer minuta escrita para o notàrío, não se invalida o
ato, se este a copiar diretamente, após lhe ter sido lida pelo
disponente".
A interpretação que dispõe o art 1.632,1 do C.Ci. deve estar
atenta à "segurança evitando-se adulterações ou falsificações e o
respeito a vontade do testador", (apud Arnold Wald, referido a fls.
1.853):
"As preocupações essenciais que inspiraram o
legislador nesta matéria são a necessidade de SEGURANÇA,
evitando-se adulterações ou falsificações, o RESPEITO A
VONTADE DO TESTADOR, que não deve ter sofrido qualquer
pressão ou influência de interessados, e, enfim, o SIGILO em que
tais disposições devem ficar em certos casos, por assim desejar
o testador".
Não vejo como invalidar ato público, por oficial redigido em
seu Livro de Notas, sendo que as declarações do testador foram lidas
e confirmadas por este na presença de cinco testemunhas.
E a jurisprudência consolida-se no sentido de que a
observação dos requisitos formais exigidos pelo art. 1.632 do C.Ci.
não pode ser tão rigorosa, a ponto de afastar os conceitos de
modernidade, segurança cartorária, na sua confecção. Há que se
entender por declarações do testador aquelas por ele minutadas e
confirmadas expressamente, perante as testemunhas instrumentárias
presentes, após leitura pelo Tabelião.
As circunstâncias e fatos que ladearam a lavratura do
testamento público atacado pelos autores trazem dúvidas quanto à
higidez mental do testador, e seu perfeito discernimento quando da
lavratura do testamento anulando. Não se tem, porém, certeza da
referida capacidade.
Ora, o testador nasceu em 1905 e possuía mais de oitenta e
cinco (85) anos quando da lavratura desse ato. Casou-se com a sua
companheira de pouco mais de quatro anos C., a 17/10/90, à qual
houvera doado ações do B. S/A, renunciando, a 30/11/90 ao
usufruto que sobre as mesmas possuiria.
Há precedentes importantes que não podem ser ignorados
na solução da causa. AA era um homem respeitabilíssimo
no mundo das finanças, tendo contribuído, com seu labor, argúcia e
tirocínio, para a formação de uma das instituições bancárias privadas
mais importantes no mundo; foi sempre generoso com os familiares,
netos e filhos; estava vivendo há mais de quatro anos com CLCA,
quando com esta contraiu núpcias; havia
uma diferença de idade razoável entre ambos, A e C, cerca
de trinta e nove anos; quando de seu intemamento hospitalar, mais de
ano antes do óbito, no Hospital Gastroclínica, a 28/08/89, teve
diagnosticada insuficiência vascular cerebral, com inúmeros períodos
de confusão mental (fls.582/583); em fevereiro de 1990 retirou-se da
Presidência do Conselho de Administração do BB S/A;
havia, também, litígio com filhos face o inventário da primeira esposa
do "de cujus".
Estes são alguns dos fatos relevantes, em que se lastreou o
Juízo "a quo" para a procedência da demanda.
Mas cabe salientar que os períodos de confusão mental
advindos quando da internação no Hospital Gastroclínicas, podem ter
sido episódicos, ocasionais. Além disso, a retirada, aparentemente
voluntária, de alguém com limitados problemas de deambulação e
temporários de incontinência urinaria, octogenário rico, da Presidência
do Conselho de Administração de qualquer empresa, não tem nexo de
causalidade com incapacidade mental. Outrossim, problemas de
velhice e de saúde, podem não arredar a lucidez do testador.
E a 12/12/90 fez testamento beneficiando sua esposa
C, com todos os seus bens. Vinte dias após, é internado
hospitalarmente, já em U.T.I. e falece com infarto agudo do miocárdio.
Se a ação proposta pelos ora demandantes tivesse como
causa a captação da vontade do testador por coação psicológica
daquela da qual ele seria totalmente dependente, a solução, para o
signatário desta, até poderia ser outra.
Senectude, por si só, não será motivo de incapacidade. O
que importa saber é se o testador tinha plena consciência do que fazia
e tinha discernimento de seus atos. Se, efetivamente, pretendia
aquinhoar a sua então mulher, com todos os seus bens.
Não me parece que estivesse, quando da leitura e
subscrição do testamento o Sr. AA, sem suficiente lucidez
para ter alguma dúvida sobre o que estava fazendo.
Por outro lado, o próprio jurisperito sintetiza, como razão
para concluir que o testador tinha dificuldades para entender o que
estava fazendo, a probabilidade de ter doença de "Binswanger",
caracterizada esta por declínio cognitivo a partir dos níveis de
funcionamento mais altos atingidos anteriormente, manifestado peto
comprometimento da memória e de dois ou mais campos cognitivos"
(fls.591).
O laudo pericial traz como hipótese diagnostica à época do
testamento:
o Doença pulmonar obstrutiva crônica; 2
o demência em quadro de encefalopatia subcortical de Binswanger (fls.604).
E a conclusão do excelente laudo judicial é a seguinte:
"Baseado em extensa revisão da história, antecedentes,
exames clínicos e neurológicos realizados assim como das
tomografias e ressonância magnética, POR OCASIÃO DO
TESTAMENTO, O PACIENTE APRESENTAVA UM QUADRO
CLÍNICO CONSISTENTE COM O DIAGNÓSTICO DE PROVÁVEL
DEMÊNCIA DO TIPO VASCULAR - DOENÇA DE BINSWANGER -,
descritos nos Critérios Diagnósticos de Demência Vascular
utilizados para pesquisa que foram publicados pelo grupo de
trabalho internacional conjunto NINDS (National Institute of
Neuroiogical Disordes and Stroke - USA) e AIREN (Association
Internationale pour Ia Recherche et l'Enseignement en
Neurosciences-França) 19-21 abril, 1991 (fls.12).
Ele vem ratificado pelo laudo crítico dos autores.
O laudo assistência! dos réus minucioso (fls.886/994),
responderia, com convicção, que o Sr. AA tinha pleno
discernimento e consciência do que fazia quando da lavratura do
testamento.
Utilizou-se, para realização de seu laudo, não só da análise
de documento médicos, como principalmente, do retrospecto visual e
oral coletado de entrevistas de sete médicos, inclusive neurologistas e
geriatra que o atenderam, além de pessoal de enfermagem que com
ele ficava, concluindo pela higidez mental e lucidez do paciente.
Ora, o Poder Judiciário não está adstrito às conclusões do
laudo majoritário, se lhe parecer mais convincente o do crítico dos
demandados.
Acrescente-se que se tratam de laudos retrospectivos e que
a prova oral deve ser utilizada para deslinde da demanda.
Assim, um dos auxiliares de enfermagem que dele cuidou,
entre 1989 e 1991, vários dias, por semana, conversava com o "de
cujus" normalmente, não notando qualquer sinal de demência
(fls.1.489/1.492).
O cardiologista Dr. Abrahão, que tratou de AA
entre 1965 e 1991, e que se disse seu amigo e confidente, foi
expressivo quando relatou não ter constatado nele sinal de demência,
acrescentando que, quando da doação do imóvel a da. C achavase em perfeito estado psicológico (fls.1.493/1.496).
O médico intensivista, Euzébio Sílvio Jodar Lopes,
conhecido do testador há cerca de trinta (30) anos, após declarar que
este não apresentava, para ele, qualquer sinal de demência, e esteve
na "casa dele" após 1989 (fls.1.503/1.505).
A enfermeira Rosely que cuidou por seis meses do falecido,
que para ele trabalhava à noite, refere que conversava com o "de
cujus" sobre todos assuntos, entendendo-o em juízo perfeito e lúcido
(fls.1.512/1.514).
A médica Dra. traci (dermatologista) mostra que sempre
entendeu lúcido e com pleno discernimento psicológico o seu cliente,
referindo-o "sempre em plena capacidade física, psicológica, lúcido,
consciente" (fls.1.515/1.516). Este testemunho é relevante, e mesmo
com as reservas devidas pelo fato de continuar a ré sendo sua cliente,
porque abrange o período suspeito de incidência da doença de
Binswanger.
O médico gastroenterologista Paulo Bobadillha, que era
conhecido do testador há mais de trinta e cinco anos, foi testemunha
instrumentáría, abonando a capacidade mental preservada e a lucidez
do testador.
A enfermeira Suzy Mary diria ser o paciente "muito lúcido", e
que o acompanhou, em viagens à Europa, em junho de 1990, quando
fez este tratamento "para revitalização biológica celular"
(fls.1.520/1.522).
A auxiliar de enfermagem diz não ter notado qualquer
distúrbio mental no Sr. AA, o mesmo relatando a
enfermeira Leodete, que dele cuidou até fins de 1990 (fls. 1.523/1.526).
Uma única testemunha revela problemas de memória de
repetições do falecido testador (fls. 1.474/1.480).
A testemunha instrumentáría Dr. Fernando, admite não ter
constatado à época (11/90) sinais de demência ou de falta de lucidez
(fls. 1.485/1.488).
Duas outras testemunhas foram hesitantes e não se
lembraram de detalhes. E a fita de casamento celebrado dias antes
não revela, como sinalizado pelo jurísperito, anormalidade de conduta
de uma pessoa idosa (cf. fls. 1.069/1.086).
E Lázaro de Mello Brandão, pessoa ilibada e insuspeita, e
que visitava freqüentemente AA, quando este se retirou da
presidência executiva e do Conselho de Administração do Grupo
B, até por duas vezes por semana, disse que, até nos últimos
dias, dizia o visitado palavras claras, lúcidas, não crendo que ele
portasse demência e que ele tinha "bom discernimento"
(fls.1.506/1.512).
Parece-me que este testemunho comprova que o Sr.
AA tinha plena ciência do que estava fazendo e do
testamento que ele fez.
Se tantas pessoas, que conviveram com o testador,
confirmam, como o fizera o laudo crítico dos réus, que sabia aquele o
que fazia, que tinha lucidez e discernimento mental, a ação só poderia
serdesacolhida.
Como diz Ney de Mello Almada:
"É perfeitamente válida a premissa de que todos se
presumem no domínio de suas faculdades mentais. A demência,
ou alienação mental, ou loucura de todo o gênero - nâo importa
aqui rigor terminológico - constitui exceção, e como tal devendo
ser cumpridamente provada" (Direito das Sucessões, vol. II,
Sucessão Testamentária, ed. Brasiliense, ed. 1991, pág. 96).
A conclusão do jurisperito seria de "provável demência do
tipo vascular - Doença de Binswanger" (fls.596).
É evidente que a lucidez do testador deve ser aferida no
momento da leitura e da assinatura do testamento. Obviamente, além
do advogado que o deve ter assistido à ocasião, e do escrivão, que
portou fé ser aquela a sua vontade, cinco (5) pessoas testemunharam,
que o Sr. AA sabia o que estava fazendo, era aquilo que
ele queha.
Mesmo que dúvidas houvessem, deveriam elas ser dirimidas
em abonando a vontade do testador e pela validade do testamento.
A leitura dos laudo e, bem assim, dos vários testemunhos,
trazem incerteza quanto a falta de lucidez e compreensão do ato de
testar, e da própria anulabilidade perseguida do testamento por
incapacidade mental do falecido.
Não posso ratificar, contudo, apesar da validade formal
testamentána, a exclusão das filhas de suas legítimas. Entendo que a
validade do testamento só diz respeito â parte disponível, enquanto
não houverem as filhas sido excluídas, por deserdação motivada,
judicialmente, do ato de última vontade. Houve clara e nítida intenção
do disponente de seus bens "post mortem" de assim proceder.
Inequívoca a intenção do testador. Sabia este o que estava
fazendo.
A doutrina de Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira
(Inventários e Partilhas, Teoria e Prática, 9
a  ed., Leud, pág. 109/110),
é clara:
"Só haverá sucessão legítima quando não houver
sucessão testamentária, isto é, a regra é a sucessão por
testamento, enquanto que a sucessão legítima é supletiva".
Remontam, porém: "Apenas quando houver herdeiros necessários
(descendente e ascendente) é que o testamento não poderá se
sobrepor a vontade da lei; não se podendo dispor de mais de
metade dos bens, em respeito à legítimas desses herdeiros
necessários".
E, embora pudesse haver argüição de impedimento legat
(burla e fraude à lei) para doação inter-vivos "entre pessoas casadas
pelo regime de separação absoluta de bens", inexistente óbice, face a
legislação em vigor, para a disposição de última vontade feita,
respeitadas, - à evidência -, as legítimas descendentes.
A meu ver, - e isto deve ser dirimido no Juízo do inventário
(inclusive quanto às cláusulas restritivas colocadas) -, poderia ser
decidido ali sobre a alternativa colocada pelo testante na parte
restante do documento público de fls. 41/43.
Também, quanto às doações de ações, em tese, possível a
análise por ação própria.
Faço estas observações, embora não façam elas parte do
libelo, ressalvando, que sejam as primeiras (exclusão indevida das
legítimas) reivindicadas pelas filhas em sede de inventário ou ação
própria, e as segundas (anulação da doação) por ação própria.
Com estas observações, dou provimento ao recurso dos
réus e do testamenteiro, julgando improcedente a ação, prejudicado o
recurso dos autores, condenando os mesmos em custas e despesas
processuais, fixando a verba sucumbencial dos autores em cento e
ciquenta mil reais (parágrafo 4 o do art. 20 do C.P.C.), adotadas as
razões de fls. 1.943/1.946, para assim decidir, dois terços para a co-ré
e um terço para o co-réu e testamenteiro.
A condenação dos autos é solidária.
Diante da conclusão pleiteada pelo Relator Sorteado,
entendi cabível reformulação sobre a verba advocatícia, em se
considerando o valor dos bens testados, afim de revestir de dignidade
o labor das procuradorias oficiantes. Não estabeleceu proporcionalidade
com os bens disponibilizados testamentariamente pelo caráter familiar
da disputa.

Relator
APELAÇÃO CÍVEL N" 182.609-4/3 PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELAÇÃO CÍVEL 182.609-4/3 - SÃO PAULO
APELANTES E APELADOS: JAA E OUTROS
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCEDOR
1. A capacidade testamentária ativa constitui a regra
(cf. Silvio Rodrigues, Direito Civil, vol. 7, Direito das Sucessões,
pág. 102, Saraiva,  ed., 1977; Carlos Roberto Gonçalves,
Sinopses Jurídicas, vol. 4, Direito das Sucessões, pág. 32,
Saraiva, 1997; Orlando Gomes, Sucessões, pág. 86, 7
ed. atualizada por Humberto Theodoro Jr., Forense, 1999; Arnaldo
Rizzardo, Direito das Sucessões, vol. I, pág. 211, Aide Editora,
ed.).
Ensinando Washington de Barros Monteiro que
"simples enfraquecimento da memória, por si só, não acarreta
incapacidade. De qualquer modo, porém, a sentença que
acolhe argüiçâo dessa natureza deverá alicerçar-se em provas
sólidas e inabaláveis. Na dúvida, prevalece a presunção de
capacidade" (Curso de Direito Civil, o vol, Direito das
Sucessões, pág. 112, Saraiva, 27
a ed., 1991).
No caso, a perícia indireta concluiu que o testador,
quando da realização do ato, não ostentava plena higidez
mental, apontando como hipótese diagnostica doença pulmonar
obstrutiva crônica e demência em quadro de encefalopatia
subcortical de Binswanger (fls. 604), reafirmada a fls. 620
(resposta ao 12° quesito dos autores) e a fls. 622/623.
Mas a perícia indireta, já decidiu esta Câmara, deve
ser encarada com reservas e posta em confronto com os
demais elementos probatórios (JTJ 187/91, Rei. Des. Toledo
César) e a acatada pela r. sentença, com a devida venia, não
se reveste, a meu aviso, de solidez bastante a suportar as
próprias conclusões, máxime em cotejo com os demais
elementos de convicção trazidos aos autos.
Assim é que a declaração firmada pelo Dr. Ivan
Estevam Zurita Jr., constante de fls. 54, de que o Sr. AA ,
entre 11 e 23 de outubro de 1989, apresentou "quadro
de confusão mental, devido quadro clínico de hipoxia cerebral
por broncopneumonia e isquemia cerebral por arterosclerose",
não se presta a suportar entendimento dessa ordem.
A uma porque o Dr. Ivan Estevam Zurita Jr., além
de não haver receitado medicações para problemas mentais,
como o exame dos prontuários revelou ao perito e ao assistente
técnico dos réus (fls. 621 e 937), não observou demência no
testador, conforme consta das críticas apresentadas pelo Dr.
Álvaro Pacheco e Silva (fls. 911).
E a duas porque o Prof. Odon Ramos Maranhão,
no parecer colacionado pelos autores com a inicial, após dar
conta de que o quadro clínico de anoxia cerebral nem sempre
resulta em conseqüências graves, afirma que "a alta hospitalar
próxima fala a favor de seqüelas menores ou até reversíveis, a
serem apuradas" (fls. 64).
A par disso, o perito judicial, a fls. 604, escreveu
que "não houve exame neuro-psicológico detalhado para se
conseguir a difícil diferenciação entre depressão e demência",
tendo afirmado, a fls. 619, que "para se fazer o diagnóstico de
provável demência (neste caso do tipo vascular) seria
necessário um exame neuro-psicológico detalhado
comprovando o déficit cognitivo. Este exame nunca foi realizado
no caso em questão. Para se fazer um diagnóstico definitivo de
demência vascular seria necessário o exame neuro-psicológico
detalhado e a confirmação histo-patológica (biopsia ou
autópsia) demonstrando comprometimento do parênquima
cerebral".
E acabou escudando o seu entendimento quanto à
provável demência de que estaria acometido o Sr. AA, no
relatório da ressonância magnética a que foi ele
submetido e onde se deu conta dos achados se mostrarem
"compatíveis com infartos múltiplos confluentes em territórios de
artérias penetrantes da substância branca com atrofia cortical e
dilatação ventricular secundários correspondendo ao quadro
patológico da encefalopatia de Binswanger" (fls. 604 e 819).
Mas como foi enfatizado pelo Dr. Sérgio Santos
Lima, no parecer que instruiu as críticas do assistente técnico
dos réus, e que veio apoiado pelo Prof. Marcos Pacheco de
Toledo Ferraz, no pronunciamento de fls. 1.547/1.558, "o
diagnóstico de encefalopatia arteriosclerótica subcortical do
ponto de vista morfológico, quer por tomografia
computadorizada ou por ressonância magnética, não implica
necessariamente na associação com o quadro clínico de
demência. No levantamento realizado por Preston R. Lotz...,
onde se correlacionou os achados por tomografia
computadorizada da encefalopatia arteriosclerótica subcortical,
confirmada por exame anatomopatológico pós-mortem, com os
achados clínicos, observou-se que a incidência de demência foi
em menos de 50% dos pacientes. Esta também tem sido nossa
experiência pessoal de neuroradiologista: temos examinado
vários pacientes com achados morfológicos semelhantes aos
do caso em questão e temos observado que clinicamente os
pacientes apresentam uma gama muito grande de variação
quanto ao seu estado mental, desde normal até demência; em
nosso caso a avaliação do estado mental dos pacientes não foi
feita através de exame psiquiátrico especializado e sim
baseado na nossa própria observação e na informação dos
médicos atendentes dos diferentes pacientes" (fls. 948/949).
É verdade que o perito, nos esclarecimentos de fls.
1.538/1541, asseverou que além do diagnóstico por imagem
(tomografia e ressonância magnética), os médicos Drs. José
Paulo Smith Nóbrega e Oswaldo Telia Júnior descreveram
quadro clínico de depressão, com o exame clínico corroborando
o diagnóstico de demência.
Mas além do quadro clínico de depressão não
guardar necessária relação com o estado de demência (parecer
do Prof. Dr. Marcos Pacheco de Toledo Ferraz, a fls. 1.550 e
relato prestado pelo Dr. Paulo Bobadilha Carvalho Fontes ao
assistente técnico Dr. Álvaro Pacheco e Silva, a fls. 905,
atribuindo-o a problemas familiares), não foi ela afirmada por
nenhum dos médicos entrevistados, quer pelo perito, quer pelo
assistente técnico dos réus, o que foi ratificado, em pretório,
sob o crivo do contraditório e as penas do perjúrio, pelos
médicos Drs. Oswaldo Inácio de Telia Júnior (fls. 1.484),
Fernando Menezes Braga e Paulo Bobadilha de Carvalho
Fontes, ambos testemunhas da lavratura do testamento (fls.
1.487/1.488 e 1.517), Abrahão Isac Levin (fls. 1.494), Euzébio
Silvio Jodar Lopes (fls. 1.498) e Iraci Almeida Bodjadicen (fls.
1.515).
Assim também depuseram os enfermeiros José
Amaro Gouveia (fls. 1.490), Rosely Testone (fls. 1.514), Suzy
Mary Ezaki (fls. 1.520), que acompanhou o Sr. AA
na viagem que fez para a Europa, em 1990, Agda Maria de
Assis (fls. 1.524) e Leodete de Oliveira Guerhordat (fls. 1.526).
Mais a mais, Lázaro de Mello Brandão, contra
quem nada se alegou de útil e contando, nesse passo, com o
aval de Hysaio Mytsumore, ex-motorista de AA e
atualmente a serviço da autora Denise (fls. 1.479), deu conta de
que mantinha contato amiúde com o testador, mesmo depois da
sua retirada do Conselho de Administração do B, o que
fez até os seus últimos dias. Tendo afirmado não acreditar na
demência de AA ("ele tinha plena participação do
que falávamos, do que conversávamos"), que jamais mostrou
sinais de confusão mental (fls. 1.508/1.509).
Não servindo para desmerecer tais relatos o
depoimento isolado de Hysaio Mytsumore, de que o testador
não falava coisa com coisa e sofria de perda de memória, tanto
mais quando o próprio Hysaio afirmou que sempre foi chamado
pelo nome e nunca foi esquecido por AA, que
jamais estranhou sua presença (fls. 1.477,1.479 e 1.480).
De outra banda, a incontinência urinaria pode ser
debitada à hipertrofia prostática, referida no documento de fls.
469/470, como deu conta o assistente técnico dos réus, a fls.
926 e encontra eco no Dicionário Médico Andrei, de L. Manuila,
A. Manuila e de M. Nicoulin, tradução do Dr. Cláudio Roítman,
Andrei Editora, 1997, págs. 604/605, verbete prostatismo.
Ao passo que a dificuldade para assinar, ou até
mesmo a sua impossibilidade, vinham de longa data, como se
vê, exemplificativamente, das cartas acostadas a fls. 225/227,
235/236 e 356/357, todas endereçadas à ré C, com quem
vivia em estado de casado desde 1984, a primeira delas datada
de 19 de dezembro de 1985 e que teve de ser escrita pela
autora Denise, e a última datada de 9 de dezembro, também de
1985.
Ou no contrato social reproduzido a fls. 327/333,
firmado a 13 de fevereiro de 1989, entre o Sr. AA e
alguns dos litigantes, na qualidade de sócios da S.M.A. Ltda.
Todos esses comemorativos, irrelevante a idade
avançada, máxime para um homem de incomum capacidade
laborativa, como foi o testador, mostram não desmerecida a
presunção de que era capaz quando da prática do ato, razão
pela qual a pretensão inaugural, nesse passo, é de ser julgada
improcedente.
2. Quanto ao pleito de nulidade do testamento, por
alegada inobservância das formalidades legais, tenho que
também não comporta guarida.
É da doutrina de Washington de Barras Monteiro,
nada impedir se apresente o testador "perante o tabelião com
minuta redigida por advogado, ou recorra a notas e
apontamentos particulares, para melhor encaminhar o
pensamento e bem enunciar sua última vontade" (ob. e vol. cit.,
pág. 112).
Orientando-se, por igual, Carlos Roberto
Gonçalves, para quem "a vontade do testador deve ser
externada ao oficial público sob a forma de ditado ou de
declaração, admitindo-se a entrega de minuta previamente
elaborada (seguida da declaração verbal de que contém a sua
última vontade)" - ob. e vol. cit., pág. 37.
E bem assim Arnaldo Rizzardo, ao asseverar que
não há impedimento a que o testador leve escrita sua minuta,
ou consulte anotações previamente elaboradas, "e que
simplesmente leia o oficial o escrito, mas indagando, em
seguida ao testador, com detalhes, sobre o que se encontra no
papel, na presença das testemunhas (ob. e vol. cit., pág. 254).
Ensinando Orlando Gomes, de seu turno, que "as declarações
do testador podem ser ditadas, nenhuma proibição havendo
quanto ao uso de minuta ou apontamentos. Na prática, a leitura
é dispensada, limitando-se o tabelião a copiar a minuta
entregue pelo testador, geralmente esboçada por um
profissional" (ob. cit., pág. 104).
Ora, não só o oficial que lavrou o testamento portou
por fé pública haverem sido obedecidas as formalidades legais,
de sorte que aos autores, a teor do artigo 333, inciso I, do
Código de Processo Civil, competia produzir prova em
contrário, como não há dúvida alguma de que o testador,
previamente, lhe entregou a minuta do testamento, que aprovou
por escrito (cf. fls. 299/300).
Ademais restou comprovado, por meio dos
depoimentos dos Drs. Fernando Menezes Braga e Paulo
Bobadilha de Carvalho Fontes, ambos testemunhas da
lavratura do testamento, que o testador, à ocasião, não só
estava lúcido, como o ato representava a sua vontade (fls.
1.487/1.488 e 1.517), ratificando o que já haviam afirmado
quando foram entrevistados pelo Dr. Álvaro Pacheco e Sitva,
assistente técnico dos réus (fls. 902 e 906).
O que faz irrelevante o fato do Oficial, de posse da
minuta que lhe fora entregue pelo testador, haver se dirigido
inicialmente ao tabelionato, para fazer imprimir o testamento no
livro próprio do cartório, e depois com ele voltar à residência do
Sr. AA, para dar cumprimento às demais
formalidades legais.
Pois como decidiu o Colendo Superior Tribunal de
Justiça, "o testamento é um ato solene que deve submeter-se a
numerosas formalidades que não podem ser descuradas ou
postergadas, sob pena de nulidade. Mas todas essas
formalidades não podem ser consagradas de modo
exacerbado, pois a sua exigibilidade deve ser acentuada ou
minorada em razão da preservação dos dois valores a que elas
se destinam — razão mesma de ser do testamento —, na
seguinte ordem de importância: o primeiro, para assegurar a
vontade do testador, que já não poderá mais, após o seu
falecimento, por óbvio, confirmar a sua vontade ou corrigir
distorções, nem explicitar o seu querer que possa ter sido
expresso de forma obscura ou confusa. O segundo, para
proteger o direito dos herdeiros do testador, sobretudo dos seus
filhos" (RSTJ 148/467, Rei. Min. César Asfor Rocha).
3. Foram estas as razões que me levaram a prover o
recurso dos réus para julgar a ação improcedente, ficando, em
decorrência, prejudicado o recurso dos autores, que
responderão pela sucumbência, na forma determinada pelo
Senhor Desembargador Revisor.
WALDEMAR NOGUEIRA FILHO
VOT0 2.574-TJ  APELAÇÃO CÍVEL 182.609-4/3

DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
APELAÇÃO CÍVEL N° 182.609-4/3
SÃO PAULO
I. Pedi adiamento, depois de já haver proferido voto como
Relator, porque fiquei impressionado com a qualidade jurídica dos votos
dos eminentes Desembargadores Revisor e o
Juiz.
Depois de ouvi-los, pensei até em acompanha-los.
Mas, de repente, me lembrei que havia um testamento
anterior, apresentado sem impugnação alguma, onde, portanto, se
apresentava o testador em seu perfeito juízo e encontrando-se o
testamento formalmente em ordem.
Assim, deveria existir uma razão, qualquer que fosse, que
justificasse a edição de um segundo testamento, totalmente em conflito
com o anterior, onde o ilustre banqueiro beneficiava seus netos.
Deveria existir uma razão que indicasse a mudança de rumo.
Por que o testador, tão atencioso para com a família, de repente, quase
morrendo, realizasse um segundo testamento exatamente para
prejudicar suas filhas e seus netos, para beneficiar uma jovem senhora,
40 anos mais nova do que ele?
Por que não teria dividido sua fortuna entre todos: sua jovem
esposa e suas filhas e netos?
Haveria de ter, no segundo testamento, uma explicação, uma
justificação, uma motivação.
Os dois testamentos constituem um "ato jurídico*.
Esses dois atos jurídicos geram conseqüências jurídicas
previstas em lei e não pelas partes interessadas.
Examina-se neles a atuação da vontade do testador, elemento
importantíssimo na realização do ato jurídico, porque se trata de um ato
a que a ordem jurídica confere efeitos inevitáveis.
Portanto, se o primeiro testamento se consumou segundo a
norma vigente ao tempo em que se efetuou, produzindo seus efeitos
jurídicos, a segurança desse ato jurídico só pode ser quebrada por um
outro ato jurídico motivado ou fundamentado.
Para que eu aceitasse a validade do segundo testamento
haveria de tê-lo como motivado e fundamentado, pois, caso contrário, eu
estaria infringindo a regra do art. 93, IX, da Constituição Federal que
exige que todo julgamento do Poder Judiciário seja motivado e
fundamentado.
Fundamentar significa dar as razões, de fato e de direito, pelas
quais se justifica a procedência ou improcedência do pedido.
Assim, para satisfazer esse requisito constitucional, fiz, no
meu voto, análise concreta de todos os elementos e provas dos autos.
Então, não aceito o segundo testamento porque invalidou o
anterior, sem fundamentação alguma. Para validá-lo deveria o testador
ter se justificado, ter explicado o motivo por que estava prejudicando
seus netos, em benefício de sua atual esposa, 40 anos de idade mais
nova que ele.
Deveria ter explicado por que, no leito de morte, às vésperas
de morrer, mentalmente desequilibrado, produziu um ato jurídico tão
importante, prejudicando netos e filhas para beneficiar somente uma
pessoa.
Mas não o fez; não se justificou; não fundamentou seu ato;
não o motivou.
II. Assim, mantenho a r. sentença de fls. 1702/1715 (o volume) pelos seus jurídicos fundamentos, fora a questão da verba honorária que, pelo meu voto, a estou majorando.
JAA e outros, filhos de LMA e LMA  (filhas de AA) são netos de AA,
que faleceu em São Paulo no dia 24 de janeiro de 1991, com 86 anos de
idade.
Apenas seis dias após o óbito, a viúva C (ré nesta ação de anulação de testamento) requereu a
abertura do processo de inventário dos bens deixados pelo autor da
herança.
Também logo após o óbito, apenas quatro dias depois, o
testamenteiro Luis Francisco da Silva Carvalho (co-réu nesta ação)
distribuiu o testamento de AA lavrado nas notas do 22°
Tabelião da Capital em 12 de dezembro de 1990, em cujo testamento o
"de cujus, renegando suas filhas Lia e Lina (mães dos autores desta
ação), e prejudicando seus netos, instituía a esposa, C (co-ré nesta ação) "corno sua única e universal
herdeira de todos os seus bens e haveres deixados por ele testador ao
falecer*.
Curioso registrar que em 20 de maio de 1986 AA,
avô dos autores, havia lavrado um testamento público nas notas do 17°
Tabelionato da Capital, no qual registrou que "por ocasião de sua morte,
todos os bens que possuir venham a tocar aos filhos de Lia, Lina e
Maria Angela...".
Daí a legitimidade ativa dos autores que, com a anulação do
testamento lavrado em 12.12.90, nesta ação, pretendem fazer cumprir o
testamento lavrado anteriormente, em 20.05.86, que os beneficia.
Lendo, examinando e analisando todas as folhas deste imenso
processo, chego à conclusão de que a prova dos autos é firme no sentido
de que AA era, ao tempo do segundo testamento (de 1990),
incapaz de testar, porque, na ocasião, não estava em seu perfeito juízo.
Hipótese de infração ao artigo 1627, II e III, do Código Civil.
A prova é abundante, inclusive a perícia médica, para revelar a
incapacidade mental do testador, revelando os autos uma sucessão
impressionante de prática de atos insensatos do testador, inclusive sua
deterioração mental até mesmo por ocasião do seu casamento com a ré
C (documento de fls. volume).
Desde esse casamento, sucessivos atos que praticou
demonstram sua insegurança, imaturidade e vulnerabilidade.
Como já se disse, "a prova de alienação mental, fácil e
irrefragável quando se trata de interdito, tornar-se-ia diabólica, se
exigida quanto ao momento exato, ao instante mesmo em que se fez o
testamento* (citado por FRANCISCO CÉSAR PINHEIRO RODRIGUES, in
Código Civil Brasileiro interpretado pelos Tribunais, ed. Oliveira
Mendes, pag. 1108).
Assim, a prova é suficiente para revelar a incapacidade mental
do testador, mesmo que não interditado.
Veja-se que, entre os dois testamentos, o de 1986 e o de 1990,
no dia 18 de outubro de 1989, AA já apresentava distúrbios
mentais, pois, na lavratura da escritura de doação de um imóvel à ré
C, não a assinou, apenas imprimiu seu polegar na escritura (doe.
de fls. 55).
Anoto que nessa escritura de doação há menção expressa à
períodos de enfermidade.
Nessa época o médico Dr. Ivan Estevam Zuritta Júnior
declarou (em 9.11.89) que AA apresentava um "quadro de
confusão mental, devido ao quadro clínico de hipóxia cerebral por
broncopneumonia e isquemia cerebral por arteriosclerose*.
Importante, pois, registrar que AA, quando
praticou essa doação, em outubro de 1989, apresentava tamanha
confusão mental que lhe impedia de assinar a escritura, colocando nela
sua impressão digital.
Somente essa "confusão mentaT pode explicar a atitude de
AA, quando em 12 de dezembro de 1990 renegou suas
filhas, ignorou o testamento anterior que beneficiava os netos e deixou
todos os seus bens para sua mulher C, 40 anos mais nova!
Ainda, durante esse quadro de "confusão mentaT, que se
instalou a partir de outubro de 1989, AA, além da doação
do referido imóvel, à ré C fez a doação de setenta e cinco milhões de
ações escriturais emitidas pelo Banco, em 02.02.1990.
Não há dúvida, então, que esses desvios mentais revelam uma
incapacidade psíquica para testar a partir de outubro de 1989, época de
sua internação hospitalar.
Ao testar, AA estava com a idade de 85 anos.
Assinou o testamento em 12 de dezembro de 1990 com um quadro
clínico indicando períodos de sonolência e confusão mental. Em 09 de
janeiro de 1991 é internado em UTI, falecendo no dia 24 de janeiro de
1991.
É certo que testemunhas vieram dizer da normalidade mental
do testador.
Mas, como bem registrou o ilustre Magistrado sentenciante,
"AA era pessoa de grande expressão social, figura admirada
por aqueles que com ele tiveram contato, muitas com sentimento de
gratidão para com ele.
Respeito, admiração e gratidão às vezes confundem as pessoas
em seus depoimentos, que, portanto, não geram credibilidade. As
afirmações não são mentirosas, mas resultam de um desejo involuntário
de esconder qualquer circunstância que na mente da testemunha possa
parecer desabonadora.
Todavia, ainda que fosse superada essa questão, vale dizer,
mesmo que se admita segurança, maturidade e responsabilidade no
testador, que não admito, nulo é o testamento por inobservância de
requisitos essenciais na sua elaboração.
Restou demonstrado que o testamento foi elaborado em
cartório, com base numa minuta elaborada, e levado à residência do
testador, onde o documento foi assinado por AA e pelas
testemunhas.
Qualquer escrito pode transmitir a vontade.
Mas no testamento deve haver maior rigor, para se ter
garantia de que traduz a vontade verdadeira, espontânea, livre de
influência.
O objetivo da exigência de requisitos exteriores não é dificultar
e sim aumentar a segurança.
Assim, o que se extrai do art. 1.632, do Código Civil, é que não
basta a simples presença das cinco testemunhas instrumentárias. Ê
necessário que todas elas assistam à integralidade do ato de redação do
testamento no livro de notas.
O testamento público, como bem registrou a sentença, exige,
não só a manifestação oral do testador, como também a unidade de ato
e de tempo.
No caso, o testamento não foi lavrado na presença do testador,
nem das testemunhas.
Foi lavrado no cartório e levado à residência do testador para
que fosse assinado.
Não foi ditado pelo testador na presença de cinco
testemunhas. Infração do inciso I, do art. 1.632, do Código Civil.
As testemunhas não assistiram a todo o ato. Infração do inciso
II, art. 1.632, do mesmo código.
Não há prova sequer que AA tivesse dito, de viva
voz, na sua residência, o inteiro teor do testamento.
Se as testemunhas assinaram o testamento e não viram o
testador redigi-lo, nem tão pouco ouviram as declarações de vontade do
testador, houve violação da lei" (PONTES DE MIRANDA, Tratado de
Direito Privado, t. 59, § 5.864, pãg. 12).
A jurisprudência é firme nesse sentido (Rev. Trib. 569/52;
617/238; 687/80; JTJ 116/248, etc).
No julgamento da apelação cível n° 009.907-4, nesta Terceira
Câmara de Direito Privado, o eminente Relator ALFREDO MIGLIORE
decidiu no mesmo sentido, lembrando lição de NEY DE MELLO
ALMADA:
Inscreve-se o testamento no elenco dos negócios jurídicos
não apenas formais, mas, além disso, providos de formalidades
essenciais, prescritas em lei. Elas não se destinam apenas à
evidenciação da existência do ato (prova), mas, mais que isto, dão-lhe
existência, validade e eficácia. O formalismo constitui garantia e
salvaguarda da faculdade de testar. A forma é *ad solimnitatem".
(Direito das sucessões, vol. II, pág. 25).
Veja-se que o testamento foi escrito via computador, gravado
em disquete próprio e posteriormente impresso através de impressora
eletrônica, em folha solta e, finalmente, prensada no livro de notas (cf.
doe. de fls. 140).
No final (doe. de fls. 142) do testamento a assinatura de
AA se apresenta absolutamente distorcida, trêmula e
defeituosa.
Assim, o testamento não foi lavrado na presença do testador,
nem das testemunhas.
E quanto às testemunhas, no lugar de terem comparecido ao
ato da lavratura do testamento pessoas conhecidas do testador, como
ocorrera no testamento lavrado em 1986, serviram como testemunhas
empregados do Escrivão, que sequer assistiram à lavratura do
testamento.
Em suma, o testamento foi lavrado em cartório,
antecipadamente, tendo o testador apenas referenciado as disposições
com sua trêmula assinatura. X
A propósito, a certidão do tabelião é revestida de fé pública,
porém até prova em contrário, que é o que ocorreu na espécie.
Confirma-se, portanto, a r. sentença de primeiro grau, que
declarou nulo o testamento.
Um só reparo merece o r. decisório de primeiro grau.
O Magistrado fixou a verba honorária em 10% sobre o valor
dado ã causa.
À causa foi dado o valor de um milhão de cruzeiros, para
efeitos unicamente fiscais.
A observação "para efeito unicamente fiscais" revela, por si só,
tratar-se de valor meramente simbólico.
Atualizando-se o valor de um milhão de cruzeiros para os dias
atuais, onde a moeda nova é *real* e não mais "cruzeiro", chega-se ao
valor aproximado de oito mil reais, realmente simbólico.
Assim, para um caso de tamanha relevância, o advogado
estaria recebendo apenas a quantia de oitocentos reais.
Então, se se trata de causa de valor inestimável, a verba
honorária deve ser arbitrada de acordo com a regra do § 4o, art. 20,
consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das
alíneas "a" a  V , do parágrafo anterior.
Dessa forma, tendo em conta o grau de zelo profissional, o
local de prestação de serviço, a importância da causa e a dedicação do
advogado, acolhe-se o apelo de JAA e outros para elevar
a verba honorária à quantia de R$5.000.000,00 (cinco milhões de
reais), ou seja, 4% do valor real da causa que é o valor da herança
(cento e vinte e cinco milhões de reais ou cinqüenta milhões de dólares).
Ê certo que se trata de uma importância significativa, porém é
certo que ela se apresenta absolutamente compatível com o conteúdo
econômico da demanda.
Veja-se que o testamenteiro pleiteia o pagamento do saldo de
seus honorários, no importe de cerca de dois milhões de reais.
Registro, outrossim, que a fortuna de AA
representa cerca de cinqüenta milhões de dólares, ou seja, R$
125.000.000,00 (cento e vinte e cinco milhões de reais). A vintena, se
prevalecesse o testamento, corresponderia, então, à aproximadamente
três milhões de dólares, cerca de R$7.500.000,00 (sete milhões e
quinhentos mil reais).
Essa mesma remuneração foi atribuída ao inventariante
dativo.
Os peritos judicias tiveram honorários arbitrados em cerca de
dois milhões de reais.
Por todo o exposto, negava provimento às apelações de C
 e LFSC e dava provimento à apelação de JAA e outros.

Um comentário:

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MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

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